O que se
conhece do trabalho quanto aos constrangimentos físicos
O trabalho
da estiva no Porto de Paranaguá é desenvolvido exclusivamente por homens. A
maioria entre 40 e 49 anos (n=198), embora façam parte trabalhadores com idade
entre 30 e 71 anos. O grau de escolaridade ensino médio completo 42,3%. Quanto
ao estado civil, casados 70,3%. São trabalhadores com 20 + 4 anos (média + desvio padrão).
A postura
para o trabalho é predominantemente em pé 43% ou posturas alternadas 46,3%. Em
terreno, que não há lugar próximo para se sentar e se sentar, podem comprometer
a segurança das operações.
O trabalho manual envolve transporte e levantamento
de carga, sacaria ( 50 kg), trabalho realizado em dupla com movimentos repetitivos que envolvem flexões,
inclinações e rotações de coluna vertebral.
O risco de lombalgia, os resultados apontam para
altíssimo risco 74,7%.
Os trabalhadores com idade mais avançada evitam se
candidatar ao trabalho na sacaria, o que ajuda a lhes preservar fisicamente,
prolongando a atividade na estiva por longos anos, fato que pode explicar como
apesar dos efeitos deletérios do envelhecimento, se mantém ativos por tanto tempo.
Os sintomas e/ou doenças relatados pelos trabalhadores foram divididos em
macrogrupos, que definiram sistemas corpóreos afetados, quais sejam:
cardiovascular e/ou circulatório, dermatológico, metabólico, gastrointestinal,
genitourinário, mental, neurológico, osteomuscular, respiratório e reumático.
Neste estudo, o sistema corpóreo mais atingido foi o osteomuscular 64,9%,
sistemas cardiovascular/circulatório 20,4%, gastrintestinal 12,3%, respiratório
6,3%, diabetes 5,6%, dermatológico 2,8%, reumático e neurológico 1,1%, mental
0,7% e genito-urinário 0,4%.
Em todas as classes etárias, o principal sistema
corpóreo atingido foi o osteomuscular, o que vai de encontro ao elevado risco
de lombalgia. Com efeito, o osteomuscular é o mais evidente, ou seja, o mais visível,
dos constrangimentos dos estivadores, como já mostraram outros estudos:
Cavalcante et al., (2005) encontraram 45% de problemas na coluna e 28% de
agravos nas articulações. Cezar-vaz et al., (2010) encontraram 71,90%
distúrbios osteoarticulares.
Contudo a realização desta atividade não
compromete apenas o sistema osteomuscular,pois existem importantes exigências mentais
impostas diariamente a esses trabalhadores, tanto é que ao serem questionados
sobre como se sentem ao final da jornada de trabalho, conseguem perceber não
somente o cansaço físico, mas também a carga mental do trabalho.
A exigência
de atenção e concentração na movimentação de diferentes tipos de mercadorias,
na coordenação das ações entre os diferentes membros da equipe, o trabalho em
turnos resultando em distúrbios sono-vigília, a angústia pela incerteza quanto
a ter trabalho a legislação e os confrontos de tercerização.
Os resultados
indicam que a maioria dos estivadores deste porto não percebem o reconhecimento
por parte de seus superiores hierárquicos, ou seja, o julgamento de utilidade
(DEJOURS, 1999).
Como aponta um estivador:
“os trabalhadores são subestimados,
descartados como copinho de café”.
Outro depoimento que se segue essa dinâmica:
“Só nos procuram em época de eleição por sermos em grande número de pessoas,
prometem coisas e depois que vencem as eleições nos esquecem”.
Esses resultados
ajudam a demostrar o impacto do trabalho na saúde e equilíbrio emocional dos
estivadores.
No que se refere ao reconhecimento social, a maior parte dos
estivadores se sentem desvalorizados, social e profissionalmente, em relação ao
trabalho que executam.
Essa desvalorização parece estar associada à conjuntura
socieeconômica e cultural, na qual está inserida a categoria de estivador.
Como
descreve um trabalhador:
“ o estivador em Paranaguá é uma classe desvalorizada,
é o ‘casca grossa’.
A mídia desvaloriza também. A cidade pensa que o estivador
é drogado, briguento, mulherengo”.
Por outro lado, mesmo diante de situações
nocivas à saúde, observou-se que a atividade do estivador favorece a construção
de uma forte identidade profissional, pois gostam do trabalho que realizam,
contribuindo para a produção de sentido e de prazer no trabalho e considera “a
liberdade, as amizades, o trabalho em equipe, o companheirismo, flexibilidade
de horários, trabalho diversificado”, como aspectos positivos da atividade,
fazendo com que esses trabalhadores ainda permaneçam trabalhando.
Pois 79% se
sentem bem fisicamente ao final do trabalho também se sentem bem mentalmente.
Mas nem todos os trabalhadores que referem um cansaço físico o associam a um
cansaço mental .
Diante de tal fato, justifica-se a necessidade de relatar
evidências de alterações nas diferentes porções do corpo e sintomas em função
das diferentes sensações relatadas pelos portuários.
O mesmo é válido para a
condição mental, sendo que estivadores com alto risco de lombalgia apresentam
maior freqüência em se sentirem pelo menos um pouco cansados 22,7% e cansados 30,7%.
De acordo com Athayde e Figueiredo (2010) no trabalho não existe uma mente e um
corpo separados que se relacionam, mas o tempo todo há um corpo si, que não é
fragmentado em parte psíquica e biológica.
Assim, compreende-se os resultados
obtidos, pois na atividade a mobilização é de todo um corpo si e não apenas de
parte dele.
Frequência relativa da condição mental dos estivadores ao final da
jornada de trabalho no Porto de Paranaguá em função do risco à lombalgia
(n=300), foi possível verificar que as regiões do corpo mais referidas com dor,
fomigamentos/dormência nos últimos 12 meses foram: parte inferior das costas
56,3%, parte superior das costas 44,3%, joelhos 36,7% e ombros 36,0%.
Fonte O QUE ESTÁ À SOMBRA NA CARGA DE TRABALHO DE ESTIVADORES?
WHAT IS IN THE SHADOW OF THE LONGSHOREMEN´S WORK
LOAD?Arlete Ana Motter,Marta Santos e Ana Tereza Bittencourt Guimarães
Revista Produção Online, Florianópolis, SC, v.15, n. 1, p. 321-344, jan./mar. 2015.
Bom
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