Dirigentes dos Ogmos não estão preparados para cumprir o que determina a Lei da Modernização Portuária, diz procurador do Trabalho
Pouco mais de dezenove anos após a aprovação da lei que torna obrigatória
a criação dos órgãos de gestão de mão de obra Ogmos, alguns de seus dirigentes ainda não estão preparados para cumprir o que determina a chamada Lei da Modernização Portuária.
A opinião é do coordenador Nacional do Trabalho Portuário e Aquaviário do Ministério Público do Trabalho MPT, o procurador Gláucio Araújo.
Em entrevista ao Jornal dos Portuários, Araújo falou sobre as condições de
trabalho da categoria, desvio de função, terceirização, jornadas excessivas,
entre outros temas. Para o procurador, embora a lei de 1993 tenha trazido
avanços consideráveis à organização do setor, sobretudo no que diz respeito
às relações trabalhistas, ainda há muitos problemas, inclusive em relação à atuação dos órgãos responsáveis por administrar o fornecimento, manter o cadastro e promover a capacitação dos trabalhadores portuários avulsos de todo o país.
Jornal dos Portuários:
Quais as denúncias mais recorrentes no setor portuário e a que condições os trabalhadores portuários estão submetidos?
Gláucio Araújo: Na parte administrativa,a cargo das Autoridades Portuárias, há casos de desvio de função, terceirização ilícita e jornada de trabalho excessiva. Já na faixa portuária, os problemas são referentes ao meio ambiente de trabalho, como falta de sinalização das vias internas do porto. Falta delimitar as pistas internas dos portos de estacionamento, demarcar vias verticais e horizontais.
Além disso, a iluminação noturna muitas vezes é precária e não há placas que indiquem os limites de velocidade. Na maioria das vezes,esse mesmo espaço é utilizado como depósito de contêineres que, empilhados, formam esquinas.
A falta de sinalização seguindo as normas do Código Nacional de Trânsito, aliada ao tráfego intenso de caminhões e máquinas pesadas gera riscos de acidentes iminentes. Como o choque entre caminhões nas esquinas formadas pelos contêineres. Outro problema é o controle no acesso de pessoas e veículos às áreas restritas dos portos. A guarda muitas vezes não está devidamente aparelhada com sistema eletrônico e biométrico.
Ou é uma empresa terceirizada, o que na visão do MPT é ilegal. O serviço de segurança deve ser feito por pessoal do quadro. Até porque, a guarda deve ter poder de polícia e ser autoridade máxima em termos de segurança.
JP: A chamada Lei da Modernização dos Portos (Lei 8.630, de 1993) prevê uma série de medidas para regularização das relações de trabalho nos portos brasileiros. Em sua opinião, o setor portuário tem se adequado a esse novo modelo de gestão?
GA: A lei veio para regularizar as relações de trabalho no setor portuário, sobretudo no que diz respeito ao trabalhador avulso.
Na medida do possível, ela vem sendo cumprida e houve avanços consideráveis. O Ogmo exerce um papel relevante, assumindo a escalação de trabalhadores avulsos.
E os sindicatos têm assimilado a função desses órgãos. No início,a implantação foi difícil, mas hoje já superamos vários entraves e discussões doutrinárias referentes à interpretação da lei. Em alguns portos brasileiros ainda encontramos problemas em relação à atuação do Ogmo como descumprimento de normas na escalação de trabalhadores avulsos e jornada de trabalho excessiva, sem intervalo.
Para sanar isso, o MPT tem atuado no Brasil inteiro de maneira uniforme,por meio de forças-tarefas para fiscalizar as condições de trabalho.
Quando detectamos irregularidades,buscamos acordos como os Termos de Ajustamento de Conduta TACs, pelo qual as instituições se comprometem a resolver as irregularidades.
Ou então recorremos à via judicial para determinar que as operadoras portuárias ajustem sua conduta e respeitem a legislação e as normas de segurança.
JP: O senhor falou do papel do Orgão Gestor de Mão Obra. E um dos problemas detectados na gestão do trabalho portuário é falta de controle e fiscalização dos Ogmos. O que o MPT tem feito quando esses órgãos não cumprem a legislação trabalhista?
GA: Os Ogmos assumiram a função deles. Em alguns portos eles estão mais organizados, em outros ainda estão carente de uma atuação mais efetiva. Em alguns locais, os dirigentes dos Ogmos não têm a experiência devida para assumir o papel que a legislação impõe a eles. Por isso, o Ministério Público tem procurado fazer com que os portos onde Órgãos Gestores de Mão de Obra já estão consolidados repassem experiência para aqueles a quem falta conhecimento técnico. Buscamos auxiliar a estruturação dos órgãos locais de acordo com a Lei da Modernização dos portos. Na Região Norte, por exemplo, temos visto algumas dificuldades. No Acre, o MPT atuou o Ogmo de Cruzeiro do Sul, por descumprimento da legislação portuária. O órgão se comprometeu a resolver o problema,mas quando voltamos o
órgão não tinha cumprido os ajustes de conduta por total desconhecimento da legislação e falta de conhecimento técnico. Então o MPT teve que recorrer à justiça para garantir o cumprimento da lei. Já em Santos e em Paranaguá,por exemplo, discutimos outras questões mais avançadas que a atuação inicial do Ogmo.
JP: E quando o Órgão Gestor de Mão de Obra não cumpre a legislação trabalhista?Já ocorreu do Ogmo não fornecer equipamento de segurança?
GA: Sim. Nesse caso, cabe ao Ministério Público do Trabalho e ao Ministério do Trabalho e Emprego fiscalizar e exigir o cumprimento da legislação. O Ogmo tem obrigação de oferecer equipamentos de segurança: luvas, capacetes,botas, macacões adequados para a atividade desenvolvida pelo trabalhador. Quem trabalha com carga de frigorífico, por exemplo,tem que ter equipamento adequado à temperatura.
JP: A convenção 137 da OIT trata das repercussões sociais e impactos para o trabalhador dos novos métodos de processamento de carga nos portos. O que o MPT tem feito para a aplicação efetiva dessa convenção?
GA: O tema é regulado em acordo coletivo. A automação das atividades de carga e descarga tem acarretado mudança drástica em relação ao quantitativo de trabalhadores que são empregados na faixa portuária. Como exemplo,posso citar os consertadores que não são mais requisitados, pois não se conserta mais carga. Há uma corrida contra o tempo e o custo do navio atracado é muito grande.
Então, a recomendação é para que as mercadorias que sofram alguma avaria sejam descartadas. Essas mudanças tecnológicas eram previsíveis,mas os trabalhadores não podem ser prejudicados. Cabe aos sindicatos, por meio da negociação de acordos coletivos, buscarem maneiras de atenuar os impactos sociais causados pela mecanização e evolução da atividade.
JP: E o que pode ser feito para minimizar os efeitos dessas mudanças?
GA: A qualificação dos trabalhadores para que possam operar em outras atividades é uma das saídas para diminuir o impacto social.
O trabalhador deve exigir que lhe de em oportunidade de fazer cursos de qualificação. É preciso garantir que os cursos sejam disponibilizados a todos os trabalhadores,respeitando os princípios da equidade e da isonomia de tratamento. Por outro lado, o operador portuário não quer suportar os custos operacionais de qualificação para todos portuários.
O assunto deve ser discutido entre os sindicatos dos trabalhadores e as organizações patronais,a fim de estabelecer critérios de escolha ou oportunidade para a qualificação de mão de obra.
Fonte FNP
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