CUSTO DE MÃO DE OBRA NO SETOR PORTUÁRIO COMO
INDICADOR DE FALHA REGULATÓRIA
O componente “mão de obra” do custo total de operação dos portos reflete uma falha regulatória, uma vez que, atualmente, a atividade portuária não é mais intensiva em mão de obra.
Os serviços de praticagem podem ser caracterizados como uma situação de monopólio privado não regulado. Isto implica a imposição de preços muito superiores aos que vigorariam em condições de concorrência ou de regulação do tipo teto de preços.
Pinto et al. 2010 revelam um quadro espantoso: o custo dos serviços de praticagem no Brasil são 2,2 vezes superiores a 35 portos internacionais 6 de referência.
Os efeitos em custos estão já mapeados e sintetizados conforme abaixo.
Dado que a atividade portuária não é intensiva em mão de obra, não se justificam os percentuais de custos apresentados.
TABELA 3
Composição percentual do custo total Em %
Componente Percentual sobre o custo total
Utilização da infraestrutura acostagem + aquaviária + terrestre 19,0
Mão de obra avulsa 19,0
Operação do terminal marítimo 8,3
Práticos 24,4
Rebocadores 21,4
Demais serviços 7,9
Fonte: CNT 2006.
Com base no Parecer no 6.180 de 2005 do Ministério da Fazenda BRASIL, 2005 foi possível observar as soluções institucionais e regulatórias para o tratamento do serviço de praticagem para 20 países, tendo em vista a falha de mercado associada a questões de segurança, que inviabiliza a vigência da livre concorrência no segmento.
Nesta análise, nota-se que apenas a Estônia acompanha o Brasil no desenho equívoco de tratar um serviço com características de serviço público como um serviço privado sindicalizado.
Dessa forma, operado privadamente, tem-se um resultado de atuação como monopólio privado desregulado, com todas as perdas de eficiência elementares conhecidas.
Por fim, cabe salientar que a questão dos práticos é uma falha institucional que merece um tratamento destacado.
A remuneração destes profissionais representa custo exorbitante para a logística portuária.
Por si só já é um sério problema a ser equacionado em qualquer proposta para dinamizar o setor portuário e ampliar sua competitividade.
Por si só já é um sério problema a ser equacionado em qualquer proposta para dinamizar o setor portuário e ampliar sua competitividade.
Qualquer proposta de simplificação regulatória não pode abster-se de enfrentar tal questão
ASSIMETRIA CONCORRENCIAL PROVOCADA PELA
AMBIGUIDADE INSTITUCIONAL
Um problema adicional do setor portuário, criado pela pouca clareza de papéis, é a concorrência assimétrica a que terminais de uso público são sujeitos diante de terminais de uso privado que movimentam cargas de terceiros.
Coexistem no setor portuário os regimes público – concessão de serviço público – e privado –autorização de serviço público.
Os terminais de contêineres por vocação atendem usuários em geral, movimentando cargas de maior valor agregado.
Entretanto, há em operação terminais privativos de uso misto, que concorrem assimetricamente com terminais de uso público, por atenderem a terceiros sem estarem sujeitos às exigências do regime público a que estão sujeitos os terminais sob concessão.
Principais diferenças entre os terminais de uso público e de uso privativo
Características Terminal de uso público Terminal de uso privativo
Modalidade de licitação Arrendamento Autorização
Responsável pelo processo Autoridade portuária ANTAQ
Prazo
- Até 50 anos incluindo prorrogação
- Obrigação de prestar o serviço de forma contínua
- Indeterminado
- Possibilidade de interrupção da atividade nos termos legais,Reversibilidade dos ativos Com reversão de bens no final do contrato, Sem reversão de bens,
Prestação de serviços, Serviço público, Universalidade no atendimento
- Acompanhamento de preços, Serviço privado, Atividade econômica
- Possibilidade de selecionar usuários e cargas, Preços livres
Contratação da mão de obra Obrigação de contratar mão de obra do OGMO
Livre contratação
Livre contratação
Regulação econômica
Aprova todas as condições de contrato de arrendamento
Apenas exige viabilidade do terminal
Apesar das inegáveis assimetrias apresentadas, não é claro se há uma real vantagem competitiva para os terminais privados em relação aos públicos.
Os primeiros possuem maiores necessidades de investimento privado em infraestrutura portuária, se comparados aos públicos, o que significa dizer que enfrentam maiores riscos em seus investimentos.
De toda forma, é inegável que ambiguidade institucional e assimetria concorrencial são sinônimos de risco regulatório, de insegurança jurídica para o investimento de todos os atores e de equilíbrio de mercado ineficiente
Outra assimetria ocorrida se refere à utilização dos terminais privativos por terceiros.
A doutrina das facilidades essenciais do direito antitruste busca dar respaldo para que terceiros – normalmente empresas menores – possam ter acesso àquela estrutura portuária de propriedade de seu concorrente, que é normalmente uma grande empresa.
A doutrina requer a existência de capacidade ociosa e que tal acesso a terceiros seja feito em bases não discriminatórias, justas e razoáveis – conceitos amplamente debatidos na literatura e jurisprudência contemporâneas.
CONCLUSÃO:
AGENDA DE MODERNIZAÇÃO NO PROJETO-PILOTO
A qualidade das instituições é fator determinante da competitividade e do desenvolvimento de um país. Neste artigo,apresenta-se o diagnóstico institucional do setor portuário e discute-se uma proposta de simplificação regulatória,que compõe um projeto-piloto de um Programa de Simplificação Regulatória PSR mais amplo.
Seu objetivo é simplificar, modernizar e rever as incongruências e desfuncionalidades de determinado desenho institucional,responsáveis por gerar amarras prejudiciais ao desenvolvimento.
Desenha-se um PSR, na sua abordagem vertical,acerca do setor portuário, tratando o porquê de este setor ter se tornado um entrave crescente à expansão da economia brasileira e o porquê de ele ter afetado de forma desigual vários setores econômicos e sociais. Identificou-se um desenho institucional confuso e incompleto, que não estabelece espaço claro para a atuação privada, o que gera assimetrias concorrenciais e insegurança para o investimento.
Por fim, realizou se um estudo de viabilidade política, identificando não apenas os aliados às reformas, mas também os setores que seriam adversários a elas.
Realizado o presente diagnóstico, inscrito neste projeto-piloto de simplificação regulatória, a sugestão principal é a revisão da Lei de Modernização dos Portos, visando completar o modelo landlord ports e a revisão do Decreto no 6.620 de 2008.
Tal processo de revisão deverá incorporar os seguintes pontos:
• extinção de instâncias e competências anacrônicas;
• fortalecimento das competências regulatórias da ANTAQ;
• instituição de contratos de gestão baseados em desempenho e qualidade para os concessionários;
• instituição de regulação do tipo “competição pelo mercado”;
• revisão do tratamento de terminais de movimentação de cargas próprias, incorporando a noção de infraestrutura essencial; e
• regulação pela ANTAQ visando corrigir falhas de mercado e evitar exercício de poder de mercado.
Em suma, as medidas a serem propostas são completar a modernização do desenho institucional e do marco regulatório, com alteração na Lei no 8.630 de 1993, para redefinir funções e competências de autoridades portuárias, conselhos de autoridades portuárias e companhias docas, e para consolidar um marco regulatório mais eficiente e simplificado.
Por fim, resta a sugestão conclusiva de evidenciar contradições do desenho institucional-regulatório do setor portuário vis-à-vis outros setores de infraestrutura, apontar urgência de definição de inteligência estratégica, de corte econômico-institucional, para desatar os nós do setor, e de propor articulação, para futura coordenação de ações, dos interlocutores pró-mudanças.
O momento não poderia ser mais propício para tal debate.
Conforme recentemente noticiado,8 está sendo discutido no governo se as 77 concessões à iniciativa privada que vencem em 2013 serão renovadas ou novamente licitadas via concorrência pública.
A indefinição é total e a controvérsia jurídica é grande, face às Resoluções no 525 de 2005 Artigo 1o, inciso III e no 1.837 de 2010 Artigo 1o da ANTAQ que preveem a
renovação dos contratos em vigor, opondo-se à Lei de Modernização dos Portos Lei no 8.630 de 1993 que prevê a concorrência pública como regra.
Já o Parecer da Advocacia-Geral da União de julho de 2011 admite que os contratos celebrados antes da Lei de Modernização dos Portos sejam prorrogados pelo prazo máximo igual ao originalmente pactuado.
Para completar, a Resolução da ANTAQ no 525 de 2005 Artigo 2o autoriza a prorrogação excepcional dos contratos de arrendamentos firmados antes da Lei no 8.630 de 1993 pelo prazo máximo de três anos, enquanto se conclui a licitação.
Modernização e simplificação regulatória no setor portuário
Modernização e simplificação regulatória no setor portuário
Lucia Helena Salgado2
Rafael Pinho de Morais
Graziela Ferrero Zucoloto
Samuel da Silva Rezende
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