Entre os cerca de mil estivadores portugueses, existem apenas 14
mulheres.
Dez em Setúbal e quatro em Sines.
Juntam-se à luta dos homens, mas
têm uma muito maior para vencer.
Margarida Pereira, Isabel Lucas e Alena
Ivanova contam como é.
São nove e meia de uma manhã de sol gelado e ao terminal da
Sadoport, em Setúbal,
vão chegando homens que daqui a umas horas rumarão a
Lisboa, para a manifestação internacional de estivadores, onde se distribuirão
geribérias às mulheres que passam,
se rebentarão petardos e se gritarão
palavras de ordem como
Somos nós, somos nós, a estiva em Portugal somos nós; Cinco
mil euros ganha a tua mãe, cinco mil euros ganha a tua mãe.
Milhares de homens
em luta contra a precarização e pela manutenção dos postos de trabalho que
consideram ameaçados pela nova lei que regulará o trabalho portuário e que será
aprovada na Assembleia da República, apesar da contestação, das greves
sucessivas e desta grande manifestação que para lá convergirá ordeiramente.
Milhares de homens e uma mulher, Margarida Pereira, estivadora há 13 anos.
Nós encontramo-la, antes, no bar pré-fabricado do terminal da
Sadoport,
com Isabel Lucas e Alena Ivanova, colegas de estiva.
Adiante na
conversa, Margarida, precária como todas as colegas mulheres a trabalhar no
porto de Setúbal, ganhando ao turno, com contratos ao dia, há-de reconhecer que
a sua luta é outra,
mais profunda, mas antes há que travar esta, porque, com a
nova lei,
a precariedade pode agravar-se ainda mais.
Mãe de dois filhos, Margarida
Pereira, 43 anos,
trabalhava no apoio domiciliário da Santa Casa da
Misericórdia de Setúbal quando uma colega, que foi das primeiras mulheres na
estiva em Portugal, a desafiou a furar este mundo dominado pelos homens. Trabalhávamos
por turnos na Misericórdia e ela começou a incentivar-me para fazer um part-time na estiva. Eu tinha a minha filha
pequenina, estava sozinha, já me tinha separado do pai dela, e precisava de
ganhar mais algum, porque lá o ordenado era o mínimo.
As inscrições para as ETP
Empresas de Trabalho Portuário abriam de três em três meses e na altura a
Naviport queria ser impulsionadora da presença de mulheres na estiva. Entrei,
fiz formação de máquinas, testes psicotécnicos, exames de saúde e fiquei.
Gostei tanto que aqui estou vai fazer 14 anos em abril.
Um ano antes da entrada de Margarida, tinha chegado Isabel Lucas,
50 anos,
trabalhou de preparadora de pintura a operária numa fábrica de automóveis
ou a soldadora, fez de tudo, em empresas que tiveram sempre o mesmo fim: o
encerramento. Desempregada e sem vocação para ficar fechada em casa, mãe de dois filhos e avó, fez-se estivadora há
14 anos.
Hoje não se via a fazer outra coisa. Há dias em que o trabalho é mais
pesado, outros em que é mais leve, mas quando se faz aquilo de que se gosta,
não custa nada, conta Isabel, que faz questão de relevar o seu lado feminino. Gosto
de fazer os meus arraiolos, gosto do trabalho da casa, gosto de tomar conta do
neto e este trabalho permite-me isso. Aquilo que, segundo algumas vozes, é um
dos fatores que mais afasta as mulheres da estiva o horário por turnos , é o que mais agrada à
estivadora. Posso trabalhar uma semana inteira, mas também posso estar uma
semana em casa e isso dá-me liberdade. Quando tenho trabalho esqueço-me da
família, da casa, de tudo, é tomar banho, comer e dormir. Quando não há trabalho
e tenho mais vagar, então faço tudo o que deixei para trás e tenho tempo para
mim. Uma coisa compensa a outra.
Não está muito dentro da contestação e o que sabe é mais pelas
notícias que vê e lê, mas acha muito bem que os efetivos lutem pelos seus direitos.
Nós estamos cá para os apoiar, porque a luta deles também é a nossa.
A ver se
não foge mais trabalho e se não põem a gente a trabalhar à hora.
Alena Ivanova, 35 anos, faz que sim com a cabeça loura ao que diz
a colega e amiga a quem trata por madrinha. Eu estava cá sozinha e apareceu ela
para me fazer companhia, diz Isabel num aparte.
Natural da Sibéria, esta
educadora de infância chegou a Portugal em 2001.
Sem nunca ter visto uma pá ou
uma enxada, trabalhou numa empresa de jardinagem, mas cansada de cavar terra
decidiu procurar um trabalho melhor.
Tentei arranjar emprego como vendedora
numa loja, mas como já tinha 30 anos nenhuma me aceitava. Entretanto, soube da
estiva, inscrevi-me e cá estou há três anos. Gosto muito e só espero que corra
tudo bem, acabe esta greve e haja trabalho para toda a gente.
No porto
alentejano ninguém se mostrou disponível para falar, mas sabe-se que três são
efetivas, uma tem contrato a termo e foram ali criadas as infraestruturas de
apoio necessárias para que o trabalho fosse aberto ao género feminino,
nomeadamente os balneários e vestiários diferenciados, investimento que segundo
Vítor Dias, presidente do Sindicato dos Estivadores do Centro e Sul de
Portugal, mais nenhum porto ou operador portuário se dispôs a fazer até hoje no
resto do país.
Seria interessante que existissem mais mulheres na estiva e hoje
a profissão, que era associada a homens grandes e brutos, em virtude da sua
evolução e da introdução das máquinas, é perfeitamente acessível às mulheres,
mas as empresas é que não estão pelos ajustes e não querem fazer o investimento
necessário para isso.
Salvaguardando que as empresas não podem ter quadros de pessoal
que respondam a todas as necessidades porque o trabalho nos portos é irregular,
o que justifica a existência de uma bolsa de eventuais, Vítor Dias considera
que, dada a quantidade de horas extraordinárias que se exige aos estivadores, é
óbvio que deviam ser muitos mais os efetivos e imputa às empresas e operadores
portuários a responsabilidade de não os contratarem.
Particularmente em
Setúbal, garante que ao longo dos anos se lutou para alterar a situação, sem
grandes resultados.
Este é o caso mais gritante e só é possível pela especificidade
do trabalho no porto, cuja tipologia de carga não exige tanta especialização e
que não tem tanta carga de linha regular como Lisboa, por exemplo.
Para as
empresas, quantos mais eventuais melhor, porque não têm encargos com os
trabalhadores, mas é uma situação socialmente indigna, sobretudo numa atividade
de risco como esta.
Fonte FOTO Carlos Cavalcanti
Há mulheres no cais
por
Catarina Pires

www.logisticananuvem.com.br
ResponderExcluirTeremos a primeira ESTIVADORA no Porto de Rio Grande - RS.
ResponderExcluirhttp://jornalagora.com.br/site/content/noticias/detalhe.php?e=3&n=72326
#politica #emprego