30 de nov. de 2012

Perguntas e respostas sobre a Praticagem III

16. Se não há impacto sobre os fretes, por que os armadores fazem tanta pressão sobre os preços da praticagem no Brasil?


Na queda de braço entre o oligopólio dos armadores e a praticagem brasileira, o aumento de lucro é fator desejável, mas secundário.
O motivo principal é a busca de domínio da atividade.
Na verdade, é a independência funcional, sem vínculos de subordinação a empresas de navegação ou a interesses outros que não a segurança da navegação a principal causa dos ataques que são desferidos contra o serviço de praticagem.
Esses grupos internacionais não aceitam que profissionais brasileiros qualificados e independentes, sob a fiscalização da Autoridade Marítima Brasileira, façam cumprir rigorosamente as normas de segurança, em detrimento de eventuais lucros que poderiam ser gerados pela quebra dessas mesmas normas.
E os práticos, muitas vezes, têm de contrariar interesses comerciais e econômicos, na defesa da segurança do porto, das pessoas e do meio-ambiente, enfim, em defesa da comunidade a que servem.
O próprio ex-Ministro Pedro Brito,
no livro “Muito a Navegar” atestou a existência dessas tentativas de interferência quando, discorrendo sobre o modelo portuário brasileiro, declarou textualmente, que
“... frequentemente, se vê no Congresso a ação de fortes lobbies trabalhando a favor dos interesses de alguns grandes armadores” (pg 44) e que
“Qualquer pressão para mudá-lo se prende unicamente a interesses estritamente empresariais e privados, desvinculados dos interesses do país” (pg 46).
As pressões de tais grupos internacionais sobre as autoridades brasileiras pela busca de privilégios ou vantagens não justificáveis não são novidade.
Vide, por exemplo, o questionamento da Hamburg Sud ao Ministério da Marinha, em setembro de 1898, sob a alegação de que havia cobranças indevidas referentes à praticagem, pela Capitania dos Portos de Paranaguá8. 8 http://brazil.crl.edu/bsd/bsd/u2135/000329.html

O Parecer do Conselho Naval, datado de abril de 1899, demonstrou que a reclamação era improcedente.
Os ataques contra a praticagem brasileira utilizam, invariavelmente, desinformações ou falácias acerca de custos e acusações depreciativas de supostos salários.
Por mais que não se deseje vincular, é quase impossível ignorar Goebbels, ministro da propaganda nazista. Ele afirmava que não se poderia permitir que a verdade prejudicasse os objetivos.
O aspecto essencial seria alcançar o propósito; se os motivos eram reais ou não, isso não tinha a menor importância.
O importante seria ridicularizar os adversários dando início a rumores mentirosos ou fazendo acusações ultrajantes.
O armador paga pelo serviço de praticagem nas duas pontas da rota.
 Como foi demonstrado pela FGV, a maioria dos destinos dos navios representam localidades onde a praticagem é mais cara.
Por que os valores, aqui, teriam de ser menores que os do exterior?
Apenas porque é no Brasil?
Apenas porque eles vêm de países desenvolvidos (onde não se atrevem a assediar seus governos com o mesmo assunto) e a praticagem representa um país em desenvolvimento?
Mais grave se torna a questão ao recordar que o serviço de praticagem prestado a estrangeiros significa exportação de serviços, ingresso de divisas e tributos integralmente recolhidos no Brasil.
Nenhuma parcela dos pagamentos é feita fora do país, diferentemente do que poderia ocorrer, por exemplo, entre algumas empresas estrangeiras de navegação e algumas empresas estrangeiras de rebocadores.
Lembrando o que constatou o BID, os armadores estrangeiros já impõem aos exportadores e aos importadores brasileiros fretes 70% superiores aos cobrados dos europeus e americanos.

17. As taxas portuárias brasileiras são altas? Elas reduzem a competitividade dos produtos nacionais?

Recentemente, em 12/11/2012, Mauro Salgado, Presidente da Federação Nacional dos Operadores Portuários se manifestou de forma muito objetiva sobre esse tema9, no jornal Valor Econômico: 9://www.valor.com.br/opiniao/2900010/imagem-e-realidade-do-setor-portuario
“Engano mais comum é o mantra "portos brasileiros são ineficientes" ou "as altas taxas portuárias reduzem a competitividade dos produtos nacionais".
Nada mais falso. O grande gargalo são a burocracia e as dificuldades de acesso ao porto.
Repetido mecanicamente há décadas, quando ainda se podia justificar alguma generalização, tal discurso é invocado ainda hoje, algo inadmissível.
Durante recente seminário em Brasília, uma entidade de classe afirmou, a jornalistas, empresários e autoridades, que os portos brasileiros cobram dos exportadores US$ 400 por contêiner embarcado, enquanto o mesmo serviço custa US$ 150 em outros países.
Ocorre que o exportador, via de regra, não paga nada ao terminal.
 Os terminais portuários cobram pelo serviço de movimentação (embarque e desembarque) de contêineres dos armadores, empresas donas dos navios - e não dos exportadores.
São os transportadores marítimos, os armadores, que cobram dos exportadores e importadores, dependendo da forma de contratação aplicada, pelo serviço de frete marítimo dos contêineres adicionado de taxas aplicadas, cujos valores são estabelecidos individualmente pelos armadores com seus clientes, procedimento comum em muitos países”.
No mesmo sentido, foi emblemática a declaração de Vicente do Valle10, Primeiro Vice-Presidente da Associação Comercial de Santos, no Fórum Santos Export, realizado em 14/08/2012:
10 http://www.portalnaval.com.br/noticia/34870/para-suportar-crescimento-porto-de-santos-precisa-de-novo-modelo-de-gestao
"Tivemos uma melhora em relação à produtividade do Porto de Santos, mas continuamos com problemas em relação ao preço. Antes da Lei dos Portos, pagávamos R$ 120 reais por contêiner para o transporte de café. Em 2004, esse valor passou para R$ 202 e, atualmente, está em R$ 605".
Ambos corroboram os dados disponíveis: em Santos, o montante pago pelo armador ao terminal seria de R$ 54,44, segundo o IPEA, ou R$63,30, segundo a ANTAQ11.11 http://www.portogente.com.br/arquivos/arq_653_100514_comu48portos.pdf Tabela 4

 Entretanto, o valor cobrado do embarcador pelo grupo alemão Hamburg Sud / Aliança, a título de ressarcimento (THC), é de R$ 661,0012. 12 http://www.hamburgsudline.com/hsdg/media/hamburgsd/documents_1/regionalinformation/sdamerika/brazil/surcharges/Capatazia_THC.pdf

Como se vê, o menor custo proveniente da maior produtividade do terminal é totalmente absorvido pelo próprio armador.
Os embarcadores não são beneficiados por aquela melhoria. Este fato também foi corroborado pelo representante da ABRATEC, na mesa redonda realizada em 30/10/2012, na Comissão de Viação e Transportes da Câmara dos Deputados13. 13 http://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/webcamara/videoArquivo?codSessao=00021793#videoTitulo

Enfim, esta é a realidade: os armadores estrangeiros auferem grandes lucros oriundos da melhoria da eficiência dos terminais brasileiros e, ao mesmo tempo, mantêm o mantra “as altas taxas portuárias reduzem a competitividade dos produtos brasileiros – é necessário reduzir os custos”.

Não bastasse esse exemplo concreto, pode ser tomada como referência a apresentação feita pela armadora francesa CMA-CGM14 (3ª maior armadora regular do mundo, segundo a “Alphaliner TOP 100”) no Fórum Democrático promovido pela Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul. 14 http://www2.al.rs.gov.br/ForumDemocratico/LinkClick.aspx?fileticket=e-dCTEFY0V8%3d&tabid=3229&mid=4649&language=pt-BR

Ali, foram apresentados os custos de uma viagem típica – Rotterdam / Hamburgo / Santos / Rio de Janeiro / Rotterdam – com duração de 28 dias, transportando 4.375 contêineres na soma da ida e volta.

Os slides 30, 31, 33 e 34 permitem montar a seguinte tabela de custos do armador: ITEM VALOR (US$)
Combustível                                                 1.451.275
Custo de embarque/descarga na exportação 1.294.125
Custo de embarque/descarga na importação    609.000
Custo de embarque/descarga para vazios        519.750
Custo do aluguel de contêineres                      416.500
Custos com manutenção de contêineres          100.000
Afretamento                                                1.120.000
Despesas Administrativas                                 56.000
Praticagem Brasil (2 portos)                             12.300
Praticagem Exterior (2 portos)                          36.000
Rebocadores Brasil (2 portos)                            5.200
Rebocadores Exterior (2 portos)                       20.256
Outras Despesas Portuárias Brasil (2 portos)     11.900
Outras Despesas Portuárias Exterior (2 portos)  35.704
TOTAL                                                         5.688.010

Dessa tabela, já à primeira vista, é fácil verificar a relação do preço da praticagem brasileira com o preço da praticagem no exterior: um terço do valor.
É a mesma a proporção entre as despesas portuárias no Brasil e no exterior: um terço.
Por fim, chama atenção, também, a diferença gritante entre os valores pagos aos rebocadores, no Brasil e no exterior: 300%.
É no mínimo estranho que equipamentos similares, com custos de aquisição e manutenção praticamente idênticos, ofereçam tal magnitude de diferenciação, ainda mais quando são lembradas as reclamações contumazes do Sindicato das Empresas Brasileiras de Navegação – SYNDARMA, referentes aos custos dos marítimos brasileiros.

Perguntas (e respostas) sobre a Praticagem no Brasil

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