Sistema portuário e organização do trabalho.
O trabalho
portuário pode ser caracterizado pela arrumação e retirada das mercadorias no
convés e porões dos navios, como também, pelo trabalho na faixa de cais.
A
atividade portuária é marcada pela diversidade em função do tipo de carga a ser
transportada, acarretando inserções distintas na composição da força de
trabalho
necessária para sua execução.
O
trabalho da estiva ocorre exclusivamente nos convés e porões do navio.
Este
envolve o embarque e desembarque das cargas, conferências destas, arrumação nos
porões, conserto de cargas no interior dos navios executados pelas seguintes
categorias:
estivadores arrumam e retiram as mercadorias no convés e nos porões
dos navios, conferentes de carga e descarga verificam, anotam e fiscalizam toda
carga embarcada e desembarcada dos navios, consertadores de carga e descarga
consertam as cargas avariadas nas operações de embarque e desembarque para que
haja continuidade
nas operações, vigias portuários cuidam da segurança das
embarcações e das cargas
, trabalhadores de bloco arrumam e amarram as cargas, descem os contêineres e limpam a embarcação.
São os chamados trabalhadores
avulsos. No cais, em terra firme, é feito o deslocamento e conferência das
cargas dos armazéns, o trabalho com empilhadeiras e guindastes arrumando cargas
armazéns/navios.
Estes são desenvolvidos pelos conferentes de capatazia, os
operadores de guindastes e empilhadeiras entre outros, denominados doqueiros
numa alusão a Companhia Docas de Santos, empresa responsável pela exploração do
Porto de Santos, que durou 92 anos.
Essa denominação caracteriza o antagonismo
porto versus navio.
A organização da atividade portuária está diretamente
vinculada à base tecnológica da indústria marítima, que se baseia em 3
componentes fundamentais:
os tipos de cargas a serem transportadas diversidade
de pesos, medidas e condições de acondicionamento; variedade na dimensão e
estado de conservação das embarcações
e instrumentos de trabalho necessários para o desenvolvimento da atividade de movimentação das mercadorias
As bases
tecnológicas do transporte marítimo sofreram poucas alterações até o advento do
contêiner por volta dos anos 60. Assim, durante muito tempo a base do trabalho
portuário foi a força física o que acentuava a dependência da atividade da
perícia e da iniciativa dos trabalhadores.
Outra característica a se ressaltar é o caráter sazonal do trabalho
exercido, que comporta muitas flutuações em razão do comércio marítimo e do
período de safras.
“Nessa época do ano,
por exemplo, tem dias que eu não trabalho, porque não tem, porque você não
consegue trabalho, tem pouco navio. Fevereiro, março e abril é pouco trabalho.”
(Clemente, conferente)
Esse caráter acaba por requerer que o trabalhador esteja
de forma permanente nas proximidades do cais em busca de trabalho, o que
favoreceu, no caso santista, a constituição de uma cultura urbana marcada por
sólidas redes de comunicação e por verdadeiras “linhagens” de famílias
portuárias. A formação dessas redes ocorria a partir de relações de vizinhança, parentesco e de trabalho.
Até o final
de 1990, para operar no mercado da estiva o trabalhador deveria ser
sindicalizado.
O Sindicato era o responsável pelo recrutamento e distribuição
do trabalho de estivagem e desestivagem das mercadorias do navio aos trabalhadores avulsos em pontos do cais
denominados “parede”.
O closed-shop controle do processo de trabalho estivador pelos próprios trabalhadores acabava por regular a entrada de novos membros ao
mercado de trabalho
. Essa reserva de mercado garantia o acesso e sindicalização de familiares de estivadores o que explica, em parte, a existência de gerações
de famílias de estivadores.
Um estudo histórico sobre a constituição da categoria dos
trabalhadores portuários,
valores como valentia e orgulho forjados num trabalho caracterizado por noções de força física e honra formaram a base da constituição identitária da categoria
valores como valentia e orgulho forjados num trabalho caracterizado por noções de força física e honra formaram a base da constituição identitária da categoria
. Esses princípios estabeleciam distinções
na execução das atividades de trabalho expressos em aptidão e inabilidade, fraqueza e destreza, masculino e feminino.
A própria identidade de portuário é
construída tendo por referência um forte senso de masculinidade, sendo a
coragem um importante valor moral a definir as relações sociais.
Ainda hoje
esse comportamento a exigir virilidade e força pode implicar no desenvolvimento
de posturas de desafio a um cotidiano de risco no exercício do trabalho, excedendo, muitas vezes, limites físicos de resistência em algumas práticas nas
atividades profissionais.
Com a
incorporação, nos anos 60 do século XX, de tecnologia no transporte de cargas
contêineres, informatização do processo, modernização das instalações
portuárias
e também dos navios ocorre uma mudança na atividade de estivagem e
desestivagem de mercadorias.
Passa-se a requerer um menor número de
trabalhadores na manipulação das mercadorias,
um trabalhador mais qualificado
para a operação de equipamentos, diminuindo, assim,
as demandas por atividades de
estiva a requerem somente força física.
A Lei 8.630 de 1993 rompe com o monopólio privado da exploração
do Porto de Santos e
desencadeia uma série de profundas mudanças na estrutura e
dinâmica portuária.
A legislação institui o Conselho de Autoridade Portuária
CAP com função legislativa sobre o porto; define a administração deste como
incumbência da Companhia Docas de São Paulo CODESP; e cria o Órgão Gestor de
Mão-de-obra OGMO, que elimina o controle da mão-de-obra avulsa portuária pelos
Sindicatos dos trabalhadores portuários.
Nesse contexto, o Estado é o responsável pela infraestrutura; os terminais são arrendados a iniciativa privada, que deve investir em
equipamentos, manutenção e operação das cargas,
ou seja, na superestrutura, no
que é denominado de modelo de porto landlord.
A reforma portuária na maioria
dos países foi feita em conjunto com uma reforma trabalhista do setor, já que o
sistema de closed- shop era vigente em muitos portos.
Pode-se
afirmar que essa mudança não ocorreu sem conflitos, sendo necessária à criação
de um grupo executivo ligado à Presidência da República para realizar o
cadastramento de
todos os trabalhadores portuários avulsos no OGMO.
Assim, somente em abril de 1996,3 anos após a
promulgação da Lei no. 8.630, tem início o registro e cadastro dos
trabalhadores portuários em Santos.
Mas, é somente em 2000, que todos os
sindicatos de portuários avulsos perdem o direito de organizarem as escalas de trabalho.
FONTE Ethos masculino, trabalho e cuidado à saúde entre
portuários de Santos/SP
Rosana Machin , Márcia Thereza Couto,
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