5 de jan. de 2014

O que Representa os Estivadores Santistas

Os estivadores do porto de Santos representam  um tipo de operariado que desenvolveu formas de organização do trabalho , de ações políticas, 
valores e crenças, muito diferentes daquelas forjadas nos espaços fabris clássicos. 
A organização do trabalho que mantinham sob controle 
implicava em uma estrutura onde chefe e subordinado partilhavam de valores comuns 
que não estavam inscritos nas formas tradicionais do modo de
 produção capitalista. 
Em outras palavras,
 a forma estrutural do sistema organizativo do trabalho, 
não era exclusivamente dada pelas propriedades objetivas da produção.
 A divisão do trabalho, 
nas operações de movimentação de cargas realizadas exclusivamente nos navios,
 não se assemelhava ao modelo clássico de produção. 
Chefe e subordinados articulavam suas ações no interior de uma cultura onde autonomia,
 permanência, hierarquia, pertenciam a um único sistema de relações 
que não era comandado pelas formas produtivas capitalistas 
planejamento, operação, controle, 
o que lhes dava a singularidade de grupo que veio a ser chamado de
 “empregados sem patrões”.

 O sentido de coletivo que daí emerge é uma construção simbólica única, 
uma categoria primaria do seu pensamento.  
As formas de organização que desenvolveram no próprio fazer-se
 nas suas ações com o Estado autocrático e paternalista, mediador das relações com o capital até 1980, na base tecnológica da indústria marítima desse mesmo período 
 que condicionava trabalho manual em grande escala, pequenas inversões de tecnologia em equipamentos  e nos longos anos sem alteração nos métodos de trabalho
 foram construtoras de um sistema de valores e crenças que definiam 
a própria forma de suas ações. 
Seus laços de pertencimento se desenvolveram no interior de um trabalho estável,
 e no ofício orientado pela ação prática. 
A base técnica e o sistema de governança que perdurou no porto em todos os anos anteriores a 1993, tiveram peso considerável na gestão autônoma 
que detinham sobre a atividade exclusivamente manual, vista como trabalho efetivo. 
 A condição de trabalhador avulso assegurava-lhe o controle sobre o mercado de trabalho e reforçava o sentido de pertencimento  frente à administração portuária
Esse sistema lhes fornecia os significados que moldavam suas ações no enfrentamento das contingências e  estruturava as formas simbólicas que orientavam as percepções sobre sua existência. 
Essas formas se reproduziram em função dos diferentes eventos históricos que enfrentaram e, a compreensão sobre a maneira como lidam com a transformação em movimento, torna a investigação de sua experiência, um imperativo. 
Na atual fase de modernização portuária eles são vistos como uma categoria que resiste a inovação.
 As resistências ao processo de modernização não se inscrevem no plano econômico ou técnico, não estão vinculadas exclusivamente a uma dimensão operacional, 
mas sim e em grande maioria, associada à elementos culturais.
 Pouco se tem estudado sobre sua cultura e a ausência de aprofundamento sobre ela tem impedido que políticas de trabalho, voltadas para novas formas organizativas no porto,
 possam ser implementadas satisfatoriamente.
Um dos pontos críticos da atual fase da mudança se referência aos embates que incluem de um lado as ações de resistência dos estivadores e do outro, as imposições postas pelas forças transformadoras: 
capital, Estado e instituições afins.
 Os impasses surgem a partir de 1993, ano da implementação da lei 8630, a lei de modernização dos portos,
 onde as ações dessas forças modernizadoras  no que se refere à adequação da força de trabalho às novas formas organizativas, são articuladas num campo político onde o discurso que justifica a transformação tem sua ênfase na necessidade da mudança  a partir da “naturalização” da dependência dos trabalhadores à estrutura totalizante do mercado. 

A problemática, aos olhos dessas forças, está centrada na ideia de que sua força cultural passada, insiste em manter-se ativa num ambiente que não lhe cabe mais
 o mesmo significado, e por essa razão, é responsável pela lentidão do alcance dos padrões de eficiência requeridos para tornar o porto competitivo. 
Essas forças optam, 

exclusivamente, pela estratégia de privilegiar os elementos inscritos na lógica do mercado onde, o império da produtividade, demanda pela formação de um trabalhador polivalente 
que apresente maior comprometimento com o seu trabalho, capaz de adiar compensação financeira, e conseqüentemente, aceite a redução do contingente.
 Essa nova forma de gestão do trabalho impacta os valores e os significados da profissão 
constituídos durante toda a história de vida da categoria. 
FONTE
Seminário Temático Numero 16 
TRANSFORMAÇÃO DO TRABALHO  E A
 CULTURA DOS ESTIVADORES DE   SANTOS

João Carlos Gomes  

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