Baseando-se num
forte autoritarismo, o gerenciamento do trabalho caracterizou-se pela extrema
parcelização das tarefas, pelo uso extensivo da força de trabalho pela adoção
de complexas estruturas de cargos e salários, voltadas para estabelecer a
divisão do coletivo operário e o controle sobre os trabalhadores.
A crise desse
padrão de uso da força de trabalho, nos anos 80, apresentada a partir de vários
estudos, caso de GITAHY,LEITE, CARVALHO e RABELO, põe em evidência a dimensão
dos conflitos advindos da transformação que ocupa também lugar de destaque nos estudos sobre trabalhadores portuários.
Salerno , mostra que “a reestruturação
produtiva tem sua lógica derivada de um contexto social, político e econômico, marcado pelas crises financeiras de concorrência intercapitalista
e de
conflitos entre capital-trabalho”, relativos à organização e controle da
produção e do trabalho e colocam para as empresas novas necessidades de
integração para dar saltos de produtividade necessários, devido tanto ao
acirramento da concorrência quanto aos entraves sociais colocados às formas
tradicionais de organização da produção e do trabalho, caso especifico do
trabalho avulso nos portos mundiais e brasileiros.
A formação da cultura portuária brasileira tem no Estado, um ator de especial relevância,
pois não só foi mediador das relações entre
capital trabalho como foi regulador das normas que possibilitaram a construção
dos elementos estruturantes da identidade dos estivadores.
Como categoria de sindicato avulso, os
estivadores tinham, seu salário administrado pelo Estado e percebido através da
entidade estivadora, agência intermediária que representava no porto os
armadores.
Além da remuneração normal, os estivadores tinham direito a 25% de
adicional para
o segundo turno de trabalho aos sábados, adicional de 35% para
mercadorias que necessitem material de proteção insalubridade, adicional de 30%
para mercadorias inflamáveis periculosidade, pagamento integral do repouso semanal remunerado inclusive nos feriados, pagamento adicional de 30% do período de serviço quando sofre interrupção por
motivo de chuva, direitos que foram adquiridos numa conjuntura em que o Estado
populista, a partir de 1950, negociava com os trabalhadores seu projeto
corporativista e que
perdurou até o final dos anos 1990.
A remuneração era significada como símbolo de condições
de vida:
“... no meu tempo, a gente podia mostrar a carteira preta da estiva no
comércio e fazia qualquer negócio, era um sinônimo de credibilidade". Lael
de Azevedo .
O decreto-lei 5452, 1/5/1943, que regulamenta o
trabalho de estiva definia os contornos significantes atribuídos a ela:
Art. 254 -
Estiva de embarcações é o serviço de
movimentação das mercadorias a bordo, como carregamento ou descarga, ou outro
de conveniência do responsável pelas embarcações,
compreendendo esse serviço a
arrumação e a retirada dessas mercadorias no convés ou nos porões.
Art. 255 - O
serviço de estiva compreende:
a) a mão de obra de estiva, que abrange o
trabalho braçal de manipulação das mercadorias,
para sua movimentação ou
descarga ou carregamento, ou para sua arrumação, para o transporte aquático, ou
manejo dos guindastes de bordo, e a cautelosa direção das operações que estas
realizam, bem como a abertura e fechamento das escotilhas da embarcação
principal e embarcações auxiliares e a cobertura das embarcações auxiliares;
Art. 257 -
A mão-de-obra na estiva das embarcações, definida na alínea «a» do
art. 255
só poderá ser executada por operários estivadores ou por trabalhadores
em estiva de minérios nos portos onde os houver especializados, de preferência
sindicalizados,
devidamente matriculados nas Capitanias dos Portos ou em suas
Delegacias ou Agências.
A profissão ganha sentido não porque se inscreve somente
nas propriedades objetivas do trabalho, mas também na exclusividade do oficio, no controle do processo de trabalho,
condições que se objetivavam através das
articulações do sindicato com o Estado.
O significado que atribuíam à vida que
levavam tinha estreita ligação com esses direitos.
Era a sua própria condição
humana, necessária para a existência da sua forma social.
O sindicato não significava exclusivamente o
provimento do trabalho, o símbolo a ele atribuído expressava os sentidos de
autonomia, de hierarquia consentida e, sobretudo de pertencimento.
Para os
estivadores o sindicato era a bandeira simbólica de uma “profissão” que
entendiam possuir, um espaço sagrado que devia ser defendido das ameaças
externas a ele, um construtor de ordens culturais para moldar a sua construção
e ação no mundo, em outras palavras, as garantias da própria vida.
As formas de
organização do trabalho dão significado ao oficio a partir das articulações com
o Estado a Delegacia de Transporte Marítimo e com a lógica produtiva Antes de ser matriculado o trabalhador era eventual.
Ele
trabalhava com a carteira profissional.
Era o bagrinho.
Ele tinha que atingir
um certo número de horas para pleitear a carteira de matriculado na Delegacia
de Trabalho Portuário DTM.
Depois que você pegava a carteira de matriculado ele
passava um certo número de horas para passar para a condição de sindicalizado.
Nesse tempo todo você tava praticamente numa escola.
Você sabia as regras até
chegar a ser estivador.
Então tinha um rodízio de 80 dias para ocupar cargo de
chefia.
Então eu estou nesse cargo eu vou à parede, nos postos de escalação, subo, aí tem um diretor que também é na forma de rodízio, ele ocupa essa
posição como fiscal, esse fiscal é que faz a escalação dos postos..
. A gente
passava três anos, fazendo os meus círculos de amizade, com todos os
trabalhadores da turma, praticamente, com todos os estivadores para quando após
os três anos a gente ia mandar de mestre,
aí naqueles três anos a gente já
sabia as pessoas que me deram trabalho, então quando você entrava na estiva você tinha aqueles 3 anos que tinha saber tudo o que tinha no navio,
trabalhar
,
conhecer as pessoas para que quando você fosse mandar de mestre você soubesse
as pessoas que você ia levar, cada 80 dias no decorrer do ano a gente mandava
de mestre,
você tinha aquele circulo de amizade, você tinha mais entrosamentos e
a gente era bem mais unidos
antigamente...
1 secretário do sindicato dos estivadores: 2007.
FONTE
Seminário Temático
Numero 16
TRANSFORMAÇÃO DO TRABALHO
E
A CULTURA DOS ESTIVADORES DE
SANTOS
João Carlos Gomes
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