O artigo em comento trata a
respeito da OIT e a aplicação normativa de suas regras nas relações
trabalhistas portuárias brasileiras.
I) A OIT está sediada em Genebra, mas as suas normas estão em
vigor aqui e deveriam ser mencionadas sempre que possível, nas relações
trabalhistas portuárias e em normas regulamentares das autoridades competentes.
II) Agora, pergunta-se: os postos de trabalho portuário,
cujas nomenclaturas existem na Lei 8.630/93 devem ser protegidos como instituto
jurídico, como garantia ao emprego e renda, conforme reza a Constituição da
República de 1988, ou devem ser simplesmente lançados e tirados da mão das
comunidades que rodeiam os portos e terminais instalados em todo o país e que
durante anos retiraram deles o seu real desenvolvimento e sustento?
Embora distante, a OIT existe sim, sua sede é em Genebra e
suas normas são total e prontamente aplicáveis no Brasil, pois o Decreto 29/93,
foi promulgado pelo Presidente do Congresso Nacional e a Convenção 137 da OIT
foi objetivamente ratificada por Decreto Presidencial.
Com relação à aplicação das regras da OIT no país,
asseveramos isso com a consciência de que esta informação é do conhecimento de
todos os líderes sindicais portuários do país, mas nem sempre os trabalhadores
das bases sabem da situação jurídica e de vinculação obrigatória que as normas
da OIT sujeitam a classe patronal aqui no Brasil.
É necessário lembrar que o sistema de produção legislativa no
Brasil, em âmbito federal, é bicameral, pois em Brasília temos a Câmara de
Deputados e o Senado Federal; diferentemente ocorre nos municípios que, por
suas vezes, tem no Poder Legislativo atuação de forma unicameral, somente com a
câmara de Vereadores.
Importante destacar, também, que o presidente do Senado
Federal é quem atua como presidente do Congresso Nacional (que é a união da
Câmara dos Deputados e Senado), e a este é dada também a incumbência de
promulgar Leis, tornado-as válidas no âmbito nacional.
É o que ocorre com a norma que tornou obrigatória, já num
primeiro momento, a análise da Convenção 137 e da Recomendação 145 da
Organização Internacional do Trabalho - OIT, quanto às negociações e demandas
trabalhistas que ocorrem em nosso país. Tal norma, além de ser um documento
histórico e valoroso para trabalhadores portuários do Brasil, possui eficácia erga
omnes (contra todos) nas tratativas do setor portuário. Veja-se:
Faço saber que o CONGRESSO NACIONAL aprovou, e eu, HUMBERTO
LUCENA, Presidente do Senado Federal, nos termos do art. 48, item 28, do
Regimento Interno, promulgo o seguinte:DECRETO LEGISLATIVO N° 29, DE 1993
Aprova os textos da Convenção n° 137 e da Recomendação n°
145, da Organização Internacional do Trabalho, relativas às Repercussões
Sociais dos Novos Métodos de Processamento de Carga nos Portos, adotadas em
Genebra, em 25 de junho de 1973, durante a 58ª Sessão da Conferência
Internacional do Trabalho.
O CONGRESSO NACIONAL decreta:
Art. 1° São aprovados os textos da Convenção n° 137 e da
Recomendação n° 145, da Organização Internacional do Trabalho, relativas às
Repercussões Sociais dos novos Métodos de Processamento de Carga nos Portos,
adotadas em Genebra, em 25 de junho de 1973, durante a 58ª Sessão da
Conferência Internacional do Trabalho.
Art. 2° Este decreto legislativo entra em vigor na data de
sua publicação.
Senado Federal, 22 de dezembro de 1993.
Assim, verificou-se que o Presidente do Senado, que também
age simultaneamente como Presidente do Congresso Nacional, promulgou norma que
o Congresso Nacional Decretou (aprovação dos textos da OIT). Agindo assim, o
Congresso Nacional atuou com intenções de proteção aos hipossuficientes nas
relações trabalhistas nos portos (portuários), com visão democrática e
garantidora dos direitos trabalhistas dos trabalhadores portuários, nos moldes
existentes e condizentes com a Constituição da República de 1988.
Posteriormente e, somente após o advento da Lei 8.630/93, o
Presidente da República Fernando Henrique Cardoso, de maneira objetiva, como em
boa parte de sua atuação presidencial, que sempre foi mais técnica do que
populista, decretou:
DECRETO Nº 1.574, DE 31 DE JULHO DE 1995
Promulga a convenção nº 137, da Organização Internacional do
Trabalho, sobre as Repercussões Sociais dos Novos Métodos de Manipulação de
Cargos nos Portos, assinada em Genebra, em 27 de junho de 1973.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe
confere o art. 84, inciso VIII, da Constituição, e Considerando que a Convenção nº 137, da Organização
Internacional do Trabalho, sobre as Repercussões Sociais dos Métodos de
Manipulação de Cargas nos Portos, foi assinada em Genebra, em 27 de junho de
1973;
Considerando que a Convenção ora promulgada foi oportunamente
submetida ao Congresso Nacional, que a aprovou por meio do Decreto Legislativo
nº 29, de 22 de dezembro de 1993, publicado no Diário Oficial da União de 23 de
dezembro de 1993;
Considerando que a Convenção em tela entrou em vigor
internacional em 24 de julho de 1975;
Considerando que o Governo brasileiro depositou a Carta de
Ratificação do instrumento multilateral em epígrafe em 12 de agosto de 1994, e
que o mesmo passará a vigorar, para o Brasil, em 12 de agosto de 1995, na forma
de seu artigo 9,DECRETA:
Art. 1º A Convenção nº 137, da Organização Internacional do
Trabalho, sobre as Repercussões Sociais dos Novos Métodos de Manipulação de
Cargas nos Portos, assinada em Genebra, em 27 de junho de 1973, apensa por
cópia a este Decreto, deverá ser cumprida tão inteiramente como nela se contém.
Art. 2º O presente Decreto entra em vigor na data de sua
publicação.Brasília, 31/07/ 1995; 174º da
Independência e 107º da República.FERNANDO HENRIQUE CARDOSO
E assim, ratificou-se, para apoio aos trabalhadores da área
portuária, a Convenção 137 da OIT, nos estritos moldes do art. 1º acima citado,
não se devendo esquecer o seguinte apontamento do Decreto do Excelentíssimo
Presidente Fernando Henrique que, a Convenção 137 deverá ser cumprida no Brasil
“tão inteiramente como nela se contém”.
É importante destacar, que muitas das atuações legislativas
(Congresso Nacional) e regulamentares (leia-se ANTAQ) na área portuária seguem
rumo natural de especialização da norma, porém, de forma muito lenta com
relação à modernização, globalização e nova ordem capitalista e ceifadora de
postos de trabalho dos portuários.
Algo realmente contundente em prol do trabalho portuário é
sempre muito raro de se encontrar no âmbito legislativo, no campo
acadêmico-jurídico e, em outras palavras, a ratificação da Convenção 137 da OIT
demorou a chegar; mas que bom que está aí e não deve ser esquecida. E atenção
para o que se destaca nas considerações iniciais da Convenção 137 da OIT, que em
sua introdução diz:
Considerando que os portuários deveriam beneficiar-se das
vantagens que representam os novos métodos de processamento de carga e que, por
conseguinte, o estudo e a introdução desses métodos deveriam ser acompanhados
da elaboração e da adoção de disposições, tendo por finalidade a melhoria
duradoura de sua situação, por meios como a regularização do emprego, a
estabilização da renda e por outras medidas relativas à condições de vida e de
trabalho dos interessados e á segurança e higiene do trabalho portuário;
Deveriam sim! Ora, a Convenção 137 diz (e ela é Lei) que os
portuários deveriam se beneficiar dos novos métodos de processamento de cargas;
e não ao contrário. Todavia, o que vem ocorrendo dia sim e outro também é o
esgotamento dos postos de trabalho, o espancamento dos salários com a
justificativa pífia e oportunista do maquinário mais moderno do operador
portuário concorrente e sem a abertura de novas vagas na área portuária, quiçá
por ser mais vantajoso para taxas de operação, atracação e de logística da
classe patronal? Abnegado TPA.
Questionam ainda a formação estudantil do trabalhador
portuário com relação ao salário que o mesmo recebe oriundo da movimentação da
carga (oras, essa carga é globalizada e seu salário deve ser bom e condizente
com a importância do que se está transportando às escondidas dentro de um
contâiner – salário bem pago da mesma forma que ocorre em outros países
portuários pelos quais a carga passa – insista-se: globalização e carga
globalizada). Essas alegações contra os trabalhadores portuários, enfim... Tudo
oportunismo!
Agora, pergunta-se: os postos de trabalho portuário, cujas
nomenclaturas existem na Lei 8.630/93 devem ser protegidos como instituto
jurídico, como garantia ao emprego e renda, conforme reza a Constituição da
República de 1988, ou devem ser simplesmente lançados e tirados da mão das
comunidades que rodeiam os portos e terminais instalados em todo o país e que
durante anos retiraram deles o seu real desenvolvimento e sustento?
Ademais, como já citamos em outros artigos, a questão voltada
à existência de uma área de porto organizado está ligada direta e
verdadeiramente a um estudo técnico realizado visando à garantia de qualidade
de vida dos cidadãos que residem e tem sua comunidade desenvolvida pelas
atividades do porto de sua localidade.
Após o estudo técnico por uma comissão criada por Lei, são
elaborados relatórios e pareceres sugerindo a criação de uma área de porto
organizado, protetiva de postos de trabalho e garantias aos portuários de determinada
comunidade (reserva legal, constitucional, válida e democrática).
Se retirarem postos de trabalho de membros das comunidades
próximas aos portos, esses valores e riquezas serão repassados e retirados
diretamente da mão do povo para a mão do empresariado e será agregado ao lucro
deste, que muitas vezes, sequer é representante de interesses nacionais,
regionais ou locais. Há a possibilidade real do surgimento de verdadeiros
bolsões de pobreza nas cidades portuárias.
Arrematando o que já disse Castro Jr. “não se deve tomar
como certa, como única opção, o corte de vagas como a principal feição do
processo de mudança[1].
Voltando-se novamente para a regra da OIT, mais
especificamente a Convenção 137, é de evidência solar que a intenção do
regramento foi a de adaptar o mercado de trabalho à modernização e mesmo assim
preservar os direitos dos trabalhadores e os postos de trabalho, que são em
realidade da comunidade e não dos donos dos terminais e das empresas
arrendatárias. O concurso público para o trabalho portuário está aí para
comprovar esta assertiva.
Inclusive, para detalharmos mais este aspecto (manutenção dos
postos de trabalho portuário), temos como certo que a diminuição destes postos
deve obedecer fielmente às regras de segurança no trabalho e não as regras do
capitalismo e, ainda, respeitar a proteção contra a mecanização existente na
Constituição da República de 1988, e sempre, repiso, sempre por intermédio de
Convenção Coletiva, caso contrário será alteração unilateral, nula e ilegal.
Assim, caso a classe dos trabalhadores não queira mais
negociar postos de trabalho, poderá simplesmente optar por repasse dos índices
e valores econômicos, pois acordos e convenções coletivas de trabalho são
bilaterais, mútuos, sinalagmáticos, em outras palavras, como diz o dito
popular: quando um não quer dois não brigam.
Se tivermos que substituir todos por máquinas, num futuro não
muito distante, não haverá mais capital circulando no comércio e na sociedade
local e isso irá com certeza desestabilizar o mercado, quem dirá em regiões que
se desenvolveram exclusivamente do porto desde sempre e que não possuem outro
setor para gerar riquezas.
Por fim, em 1973 a Convenção 137 da OIT foi assinada em
Genebra, tardiamente foi promulgada no Brasil pelo Congresso Nacional em 1993,
posteriormente, mesmo com as manifestações contrárias do Ministério do Trabalho
à época (que sustentava as técnicas rudimentares de manipulação das cargas),
foi ratificada pelo Presidente da República em 1995 e ainda hoje a Convenção
137 da OIT é permeada por uma nuvem de dúvidas e camuflagens patronais sobre
sua aplicação, mas ela está aí, vigente e forte, necessária para o equilíbrio
econômico, só temos é que lembrá-la, levá-la no bolso mesmo e aplicá-la, sem
que precisemos ter que viajar até Genebra pra saber da sua existência.
22/08/2011.
Escrito por Dr. Paul Estanislau
Imagem Mauricio Chagas
Fonte http://www.meuadvogado.com.br/entenda/oit-aplicacao-normativa-regras-trabalhistas.html
Ótimo artigo de Paul Estanislau.
ResponderExcluirReflete a realidade: se trocarem os homens por máquinas, as comunidades que se desenvolveram ao redor dos portos, não terão os seus sustentos primários, ensejando, assim, um colapso com reflexos financeiros regionais.
Parabéns pela divulgação do artigo e por ser, Renato, um ferrenho defensor do trabalhador portuário!
👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼
Silvio Menezes
Rio Grande - RS.