10:30h | Dra. Raquel Varela
“O exército industrial de reserva e a
precariedade laboral na fase atual de acumulação: qual a política da UE?”.
Os
estivadores do porto de Lisboa são uma espécie de história ao contrário dos
trabalhadores organizados no Portugal contemporâneo.
Em Fevereiro de 2014 foi
anunciado em Portugal que uma greve terminava com os estivadores a ganharem
mais do que quando ela começou.
Um sindicato serve para isto, não serve para
gerir a miséria.
A crise da estiva em Portugal ameaçava estender-se a
outros países, sob o impulso do IDC, assembléias para informar aos
trabalhadores sobre o que estava a acontecer em Lisboa e da intenção de desmantelar o quadro estável de trabalhadores .
Nas assembléias os portos que se solidarizaram pararam
as suas atividades, o que nos fez recordar as cenas de grandes lutas portuárias
da década passada, quando a extraordinária mobilização de todos os estivadores
europeus conseguiu deter as duas diretivas que teriam significado o fim de sua
profissão. O Sindicato dos Estivadores saiu desta greve fortalecido: 47
trabalhadores despedidos foram reintegrados, alguns em melhores condições do
que estavam antes e abriu-se espaço à formação qualificada de 20 novos
trabalhadores.
Os estivadores estiveram dois anos em greve, pois exigiam
a os outros o mínimo do aceitável para quem trabalhasse no Porto de Lisboa
tinha de trabalhar com os mesmos direitos dos que já lá estavam. Os patrões e a
tutela disseram-lhes para não se preocuparem que os direitos deles não seriam
postos em causa e eles responderam ,os direitos ou são de todos ou não
trabalhamos. Os estivadores não são excepcionais. Excepcional foi o
sindicalismo que se viveu em Portugal nas últimas décadas e que
sistematicamente negociou a conservação de direitos para os que estavam e
aceitou a precarização dos que vinham.
Os estivadores não colocaram diretamente em causa o poder
político, nem estão associados a uma estratégia revolucionária de derrubada do Estado, nem pediram a nacionalização dos
portos. Fizeram o mínimo para si e para os seus, e esse mínimo, hoje, surge
como revolucionário, tão baixo é o padrão de onde partimos ao fim de quatro
décadas de pacto social, moldados pela incapacidade de lutas sociais que ganhem
direitos laborais mínimos de civilização.
E a mídia : mentiras despudoradas sem responsabilidades públicas; e Bruno Bobone, representante da ACL , chegou a dizer que os estivadores tinham que desaparecer.
Os estivadores responderam com uma greve que se resumiu a isto: trabalhamos,
mas assim que entrar nesta porta um trabalhador precário paramos. De tal forma
que, numa greve de vários meses, só pararam um dia!
O Sindicato dos Estivadores, tem 100% de sindicalização.
Reúne-se, por vezes semanalmente, em plenário. Não houve qualquer negociação . Isso significa
que os dirigentes e a base estão no mesmo barco e são responsabilizados coletivamente
pelos erros e acertos. Também os estivadores de Barcelona reúnem todas as
semanas, estejam ou não em greve. Esta luta foi, como se sabe, apoiada por uma
greve européia de duas horas, a única greve de solidariedade na Europa desde a
crise de 2008.
10:50 | Dra. Rita Garcia
Pereira
“Os portos: meio apto para o assédio laboral?”.
O Assédio moral é um fenômeno
de recente descoberta em Portugal em termos legislativos, apenas tendo sido objeto
da atenção do legislador em 2003, que veio depois a alterar a definição em
2009.
Prática de perseguição insana aos trabalhadores que visa
ou compeli-los a abandonarem a organização ou procurar que se conformem com
modelos de trabalho extremamente duros, com constantes mudanças de horário, de
local de trabalho e de funções.
O assédio moral na estiva será, também, não um fenómeno
recente mas uma realidade se terá agonizado nos últimos tempos, exponenciado
pelas profundas alterações legislativas que, sob a promessa de virem criar mais
emprego, na realidade o que trouxeram aos portos foi uma mão-de-obra
precarizada, com ritmos de trabalho elevados e nem sempre em condições de
segurança.
Sob a égide da flexibilização e da concorrência e com o
espectro do desemprego a pairar, do que se tratou foi de por os trabalhadores
dos diversos portos a combaterem entre si, quase como se de empresas se
tratassem, desconsiderando-se em absoluto a pessoa que lhes subjaz e visando-se
provocar uma sangria na força sindical (que, em parte, foi conseguida).
O regime jurídico vigente teve como efeito, pretendido,
na uma mão-de-obra um nítido enfraquecimento do espírito coletivo e para a
substituição, por uma mão-de-obra indiferenciada, dócil e temerosa.
A consequência mais imediata foi o aumento dos acidentes
de trabalho mas, o efeito mais perverso, que encara os trabalhadores e os vê
como mero meio para atingir o resultado final: o lucro.
Em termos práticos, o assédio moral pode traduzir-se na perca de força negocial, através de uma
individualização o que permite uma eficaz chantagem, através da
ameaça permanente de desemprego, impedindo-se, assim, a participação em greves
ou um maior grau de resistência à mudança.
Por outro, os que
não têm cedido, têm sido objeto de diversas retaliações, culminando com o
despedimento dos eventuais, como sucedeu, tanto quanto se tem conhecimento, no
Porto de Lisboa mas, em escala mais alargada, em Aveiro. Note-se que mesmo
estes despedimentos funcionam como um meio apto de assédio moral mas,
seguramente, para os que ficam, confrontados com o exemplo do que sucede aos
que não acedem ao que lhes é pedido. Numa altura em que o desemprego é a maior
ameaça, não há arma mais eficaz para dobrar vontades. Feito este diagnóstico
liminar, pedir-se-ia o que não temos: a fórmula mágica. Podemos, contudo, afirmar
que este fenómeno só pode ser combatido de uma forma tão criteriosa e
concertada quanto é posto em prática, o que é o mesmo que dizer coletivamente.
Uma última palavra se impõe a uns estivadores em
concreto: aos bravos de Aveiro. Foram, justamente, a primeira “experiência de
laboratório” neste “admirável mundo novo” da extrema flexibilização da
mão-de-obra nos portos.
11:10 | Dr. Paulo Marques
Alves
“Contributos para uma estratégia para a saída da crise do sindicalismo”.
Um sindicato é uma associação voluntária formada na base de uma agregação de interesses e de valores partilhados pelos trabalhadores, que assim ultrapassam a competição entre si.
“Contributos para uma estratégia para a saída da crise do sindicalismo”.
Um sindicato é uma associação voluntária formada na base de uma agregação de interesses e de valores partilhados pelos trabalhadores, que assim ultrapassam a competição entre si.
O movimento sindical já atravessou várias situações
difíceis ao longo da sua história, mas vive a sua crise mais profunda desde a
década de 70, quando os seus recursos de poder tradicionais começaram a ser
fortemente erodidos. De sublinhar, contudo, que a crise apresenta intensidades
diferenciadas de país para país e que no interior de um estado nação não atinge
da mesma forma os diversos setores de atividade, o que implica a necessidade de
se proceder a uma análise mais fina para que seja possível discernir os seus
reais contornos.
Que fazer? Ainda que o estatuto institucional e uma
legislação que os proteja sejam fatores relevantes, os recursos de poder
fulcrais de um sindicato são outros. É o grau de confiança que neles é
depositado pelos trabalhadores; são os seus eletivos e a sua
representatividade; é a mobilização dos associados.
Daí que o abandono da burocratização e de uma estratégia
assente num sindicalismo de serviços em prol da democracia sindical e de um
sindicalismo de movimento social seja crucial. Recrutamento, reforço da
organização sindical de base – e um sindicato só faz sentido se estiver presente
nos locais de trabalho – e a melhoria da ligação entre os militantes sindicais
e os aderentes são questões centrais.
Paralelamente, outras ações poderão ser empreendidas.
Entre elas contam-se: o reforço da ação sindical aos vários níveis, do local ao
internacional; o reforço da solidariedade entre as várias organizações
sindicais; o estabelecimento de alianças e de coligações com outros movimentos
sociais em torno da resolução não só de questões laborais mas também extra
laborais, o que permite aos sindicatos refutar as acusações recorrentes de
“corporativismo” e aumentar a sua influência na sociedade; a adoção de um
sindicalismo enraizado na comunidade, abordagem particularmente relevante para
organizar os trabalhadores precários, dada a elevada rotação no emprego a que
estão sujeitos; a implementação de novas agendas negociais, atendendo à
crescente heterogeneidade dos efetivos sindicais e respectivos interesses; a
renovação das lideranças ou a utilização da criativa da Internet.
O recuo verificado no movimento sindical não é um indício
de uma sua decadência inexorável, das ideologias, das classes, do trabalho ou do sindicalismo. O processo a que vimos assistindo
nos países capitalistas centrais aponta antes para uma mudança qualitativa, em
que à medida que declina o sindicalismo de antigos setores operários se
consolida um sindicalismo ancorado no setor público, em torno de grupos sócio profissionais
técnicos dotados de um elevado capital escolar. O sindicalismo continua bem
vivo. O perigo é tornar-se cada vez menos representativo do conjunto dos
assalariados.
11:30 | Dr. Dra. Maria de
Fátima Queiroz
“Processo Saúde/Doença e sua Relação com a Organização do Trabalho: Estudo com os Estivadores dos Portos de Lisboa, Sines e Figueira da Foz”. A organização do trabalho aborda a forma como o trabalho é planeado, estruturado, supervisionado e avaliado. Pode se
r considerada a divisão do trabalho e a divisão dos homens. Os detentores do capital, representados nos portos portugueses, e mundiais, pelas empresas portuárias e armadores, consideram que a organização do trabalho é de sua competência e só a elas cabe a determinação de como o trabalho deve ser realizado. Como os interesses do capital são voltados para o lucro desenfreado e para a exploração dos trabalhadores, implementa-se nos portos portugueses uma organização do trabalho ancorada em conceitos ideológicos do taylorismo/fordismo. Quem pensa o trabalho não é aquele que o executa. O trabalho dos estivadores que antes era construído na comunidade passa a ser executado de forma a cumprir com metas do capital globalizado e esses trabalhadores são desqualificados nas suas lutas por melhores condições de trabalho desenvolvidas pela organização sindical dos trabalhadores nos portos. A precarização do trabalho acontece nos portos portugueses e as condições de trabalho se deterioram. Observam-se maquinarias e equipamentos obsoletos e sem manutenção adequada; a pressão das operadoras (através de seus representantes na muralha) para que os estivadores finalizem os navios em tempo exíguo. Depara-se com a falta de investimento na formação dos trabalhadores, a deficiência no número de trabalhadores contrapondo com a obrigação de atingir médias de movimentos por hora e o desenvolvimento de um modelo de organização que privilegia os conflitos entre trabalhadores ao se estabelecer a promoção na carreira não por mérito e sim por relações pessoais, modelo este próprio da dominação capitalista. Neste contexto é, por vezes, exigido que o trabalhador execute mais do que uma tarefa ao mesmo tempo sob alta responsabilidade com a carga e com a vida dos outros trabalhadores, na jornada de trabalho. Os fatores apresentados concorrem como determinantes do processo de saúde ou de adoecimento dos trabalhadores. Nestas condições ocorrem o acidente de trabalho, o adoecimento por fadiga e por lesões osteomusculares relacionadas com o trabalho, bem como as doenças que afectam a saúde mental, como é o caso das depressões geradas pelo trabalho. No caminho do conhecimento da situação do trabalho e saúde nos portos portugueses foi desenvolvida a pesquisa “Trabalho e Saúde dos Trabalhadores Portuários de Lisboa, Sines e Figueira da Foz: estudo comparativo com o Porto de Santos-Brasil”, com a participação dos estivadores dos três portos pesquisa e no desenvolvimento da Análise Ergonómica não exaustiva de situações de trabalho no porto de Lisboa.
“Processo Saúde/Doença e sua Relação com a Organização do Trabalho: Estudo com os Estivadores dos Portos de Lisboa, Sines e Figueira da Foz”. A organização do trabalho aborda a forma como o trabalho é planeado, estruturado, supervisionado e avaliado. Pode se
r considerada a divisão do trabalho e a divisão dos homens. Os detentores do capital, representados nos portos portugueses, e mundiais, pelas empresas portuárias e armadores, consideram que a organização do trabalho é de sua competência e só a elas cabe a determinação de como o trabalho deve ser realizado. Como os interesses do capital são voltados para o lucro desenfreado e para a exploração dos trabalhadores, implementa-se nos portos portugueses uma organização do trabalho ancorada em conceitos ideológicos do taylorismo/fordismo. Quem pensa o trabalho não é aquele que o executa. O trabalho dos estivadores que antes era construído na comunidade passa a ser executado de forma a cumprir com metas do capital globalizado e esses trabalhadores são desqualificados nas suas lutas por melhores condições de trabalho desenvolvidas pela organização sindical dos trabalhadores nos portos. A precarização do trabalho acontece nos portos portugueses e as condições de trabalho se deterioram. Observam-se maquinarias e equipamentos obsoletos e sem manutenção adequada; a pressão das operadoras (através de seus representantes na muralha) para que os estivadores finalizem os navios em tempo exíguo. Depara-se com a falta de investimento na formação dos trabalhadores, a deficiência no número de trabalhadores contrapondo com a obrigação de atingir médias de movimentos por hora e o desenvolvimento de um modelo de organização que privilegia os conflitos entre trabalhadores ao se estabelecer a promoção na carreira não por mérito e sim por relações pessoais, modelo este próprio da dominação capitalista. Neste contexto é, por vezes, exigido que o trabalhador execute mais do que uma tarefa ao mesmo tempo sob alta responsabilidade com a carga e com a vida dos outros trabalhadores, na jornada de trabalho. Os fatores apresentados concorrem como determinantes do processo de saúde ou de adoecimento dos trabalhadores. Nestas condições ocorrem o acidente de trabalho, o adoecimento por fadiga e por lesões osteomusculares relacionadas com o trabalho, bem como as doenças que afectam a saúde mental, como é o caso das depressões geradas pelo trabalho. No caminho do conhecimento da situação do trabalho e saúde nos portos portugueses foi desenvolvida a pesquisa “Trabalho e Saúde dos Trabalhadores Portuários de Lisboa, Sines e Figueira da Foz: estudo comparativo com o Porto de Santos-Brasil”, com a participação dos estivadores dos três portos pesquisa e no desenvolvimento da Análise Ergonómica não exaustiva de situações de trabalho no porto de Lisboa.
12:00 | Dr. Guilherme Leite
Gonçalves
“Metamorfoses da acumulação capitalista no espaço portuário do Rio de Janeiro”.
Desde Rosa Luxemburgo consolidou-se, entre os estudiosos da economia política marxista, a compreensão de que a acumulação do capital não se limita a um processo puramente económico entre capitalistas e trabalhadores nos espaços de produção da mais-valia. Ao contrário, como apenas uma parte relativa da mais-valia pode ser apropriada neste trânsito interno, o sistema necessita recorrer a um “fora” não-capitalista para realizá-la por completo. Para tanto, faz uso de violência explícita não-económica, como, por exemplo, a política colonial ou imperial, espoliações, leis sanguinárias etc. Trata-se, em outras palavras, de uma repetição da acumulação primitiva ao longo de toda a história do capitalismo. Esta repetição é exigida pela própria expansão capitalista que, para se desenvolver, precisa transformar em mercadorias espaços ainda não mercantilizados.
“Metamorfoses da acumulação capitalista no espaço portuário do Rio de Janeiro”.
Desde Rosa Luxemburgo consolidou-se, entre os estudiosos da economia política marxista, a compreensão de que a acumulação do capital não se limita a um processo puramente económico entre capitalistas e trabalhadores nos espaços de produção da mais-valia. Ao contrário, como apenas uma parte relativa da mais-valia pode ser apropriada neste trânsito interno, o sistema necessita recorrer a um “fora” não-capitalista para realizá-la por completo. Para tanto, faz uso de violência explícita não-económica, como, por exemplo, a política colonial ou imperial, espoliações, leis sanguinárias etc. Trata-se, em outras palavras, de uma repetição da acumulação primitiva ao longo de toda a história do capitalismo. Esta repetição é exigida pela própria expansão capitalista que, para se desenvolver, precisa transformar em mercadorias espaços ainda não mercantilizados.
A região portuária do Rio de Janeiro representa uma
espécie de espaço-síntese no interior do qual as diversas etapas históricas
desse fenómeno aparecem materializadas na forma de um movimento de incorporação
e desacoplamento de tal região aos processos de transformação do espaço
socialmente construído em mercadoria.
Desde sua criação até o século XIX, o porto está inserido
nos padrões clássicos da acumulação originária ao viabilizar a integração do
Brasil ao capitalismo mundial pelo escoamento do açúcar, depois do ouro, além
da entrada de bens manufacturados e de um contingente de mais de um milhão de
africanos raptados, escravizados e comercializados. O porto que mais
recebeu africanos escravizados em toda América. O espaço portuário serviu
também como cemitério de africanos recém-chegados, mercado de escravos e lugar
da prestação de serviços variados. O complexo era gerido por uma ampla
“Parceria Público-Privada”, que envolvia desde a concessão do Lazareto dos
escravos pela coroa aos três principais negociantes/traficantes de escravos até
a administração pela igreja do citado cemitério. Das técnicas violentas de inspecção
de saúde à exposição à venda e à morte, o porto do Rio de Janeiro funcionava
como espaço de disciplinamento de mulheres, homens e crianças recém-chegados da
África de sorte a desumanizá-los e reduzi-los à condição de escravos.
Essas práticas, no entanto, levaram gradativamente à
degradação económica da região portuária no âmbito da cidade, a qual cresceu e
se adensou em áreas afastadas do porto e do centro. A desvalorização económica
do espaço portuário consolidou-se após a extinção do tráfico de escravos, à
desaceleração económica, a ocupação das adjacências do porto passou a se dar,
cada vez mais, por negros alforriados e depois libertos. Conhecida como
“Pequena África”, a região tornou-se centro da cultura afrodescendente, em
especial a partir de finais do Século XIX com o florescimento do samba.
Na virada do século XIX para o XX, o espaço já se
encontrava suficientemente desvinculado da acumulação de capital para
constituir um estoque de possíveis ativos a serem (re)integrados aos processos
de criação de valor. Nesse momento, a zona portuária participou da nova fase da
expansão do capital, exigida nos termos da demanda global do capitalismo
industrial. Para tanto, duas reformas políticas , uma
promovida pelo Presidente da República, Rodrigues Alves, e a outra pelo
Prefeito do Rio de Janeiro, Pereira Passos. A primeira buscou modernizar os
serviços portuários e ampliar a capacidade de escoamento das mercadorias, de modo
a facilitar a entrada de produtos industrializados da Europa/EUA e atrair
mão-de-obra estrangeira para a lavoura cafeeira após o fim da escravidão. Já a
Reforma Pereira Passos visava, no contexto de uma renovação urbana do Rio de
Janeiro que adotava Paris como modelo, revalorizar os imóveis e terrenos da
região a partir da imposição de medidas sanitárias e urbanísticas, as quais
eram apresentadas como a materialização mesma do ideal civilizatório europeu.
Suas organizações políticas, espaços de reunião da luta
sindical dos estivadores e de manifestações vinculadas à cultura negra, foram
duramente criminalizadas, pois identificadas como obstáculos à expansão da
acumulação e do imaginário de civilização. Todo esse processo levou à expulsão
dos antigos moradores em nome do embelezamento da região e da modernização do
porto.
Portos tradicionais como o do Rio de Janeiro viam sua
capacidade de expansão limitada pelas novas funções e desenhos urbanos. Com
isso, o porto do Rio de Janeiro cede seu lugar de importância para outros
portos brasileiros.
A região chega,
assim, nos anos 1990 como espaço considerado precário e degradado, em que se
busca apagar até a vitalidade da produção político-cultural existente.
A redescoberta das manifestações culturais locais pela
juventude rica residente na zona sul da cidade que vai integrando cada vez mais
a zona portuária a seu espaço de lazer. Importante também é a perspectiva
aberta pela copa do mundo de 2014 e pelos jogos olímpicos de 2016, na medida em
que evidenciam o potencial turístico de “revitalização” do núcleo histórico da
cidade. Isto cria o contexto favorável para a
implantação de um novo programa de reestruturação urbana de toda a região
portuária, denominado Porto Maravilha.
Desvinculado,
todavia, dessa história, o projeto já viabilizou a criação de dois grandes
museus, o Museu de Arte do Rio de Janeiro e o Museu do Amanhã.
O projeto Porto Maravilha importa a construção de
infra-estrutura e edificações, financiada por uma Parceria Público-Privada
envolvendo a emissão de Cepacs, títulos negociados na bolsa de valores. Trata-se de um sistema de
captação de recursos sob contingência, isto é, a prefeitura só pode aplicar os
recursos captados nas obras previstas na região portuária. Em contrapartida, os
compradores dos títulos, conforme o site da bolsa de valores, adquirem “o
direito de construir além dos limites normais em áreas que receberão ampliação
da infra-estrutura urbana”.
Dessa perspectiva, práticas de acumulação primitiva são
reatualizadas nos termos do capitalismo financeiro. Os títulos
negociados são a materialização deste duplo movimento, na medida em que
permitem que o Estado remodele o espaço não-capitalista para integrá-lo ao
processo de acumulação e, ao mesmo tempo, garantem o monopólio de exploração do
novo espaço de acumulação a um seleto grupo de investidores.
O efeito do projeto Porto Maravilha tem sido a
remoção/expulsão de população pobre, privatização de áreas públicas, eliminação
do comércio local, apagamento da memória etc. Se, de um lado, a especulação
imobiliária tomou a região portuária, nessa mesma região marcada pela história
da escravidão, foi erguido o Museu do Amanhã, “concebido e realizado em conjunto
com a Fundação Roberto Marinho, do Grupo Globo, tendo o
Banco Santander como Patrocinador Máster”, conforma informa o site do
Museu. Assim, na medida em que a população local que, em diferentes gerações,
ocupou a zona portuária desde meados do Século XIX vai sendo removida, o espaço
vai sendo redesenhado para a acumulação do capital em vários âmbitos: na
exploração das novas atividades turísticas e culturais, na construção e venda
de imóveis nobres, nos ganhos financeiros com a especulação do direito de
construir. Uma alternativa a isso está em aberto. Depende não apenas das
diversas lutas (sindicais, políticas e culturais) nas regiões portuárias, mas
também de seu grau de unificação.

Simão:
ResponderExcluirÓtimo texto!
Somente a UNIÃO de todos os estivadores fará a diferença para as melhorias necessárias à esse setor!
Quisera que nós, aqui no Brasil, nos espelhássemos e agíssemos de forma similar às ações dos companheiros portugueses!
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Silvio Menezes
Estivador
Rio Grande - RS.
Simão:
ResponderExcluirÓtimo texto!
Somente a UNIÃO de todos os estivadores fará a diferença para as melhorias necessárias à esse setor!
Quisera que nós, aqui no Brasil, nos espelhássemos e agíssemos de forma similar às ações dos companheiros portugueses!
👏👏👏👏👏👏👏👏
Silvio Menezes
Estivador
Rio Grande - RS.