31 de ago. de 2016

Legislação ambiental e a atividade portuária


A gestão ambiental portuária tem sido motivo de preocupação em vários países e sua abordagem tem sido feita de distintas formas, cujas dificuldades parecem ser inerentes à complexidade da atividade portuária, inseridas na zona costeira. Os países europeus, a partir dos grandes acidentes marítimos ocorridos, como o do Exxon Valdez em 1989, começaram a desenvolver iniciativas conjuntas entre os portos, visando a troca de experiências com relação à gestão ambiental
Neste contexto, em 1994, a European Sea Ports Organization ESPO criou um Código de Conduta para Portos Industriais. 
Outro projeto desenvolvido entre 2002-2004 intitulado INDAPORT, procurou estabelecer sistemas de indicadores de forma a implementar o manejo sustentável dos portos, designado como EMS Environmental Management System, cujo passo do diagnóstico inicial é o padrão estabelecido pela ISO International Standard Organisation e pela EMAS Environmental Management Auditing Scheme, conforme descrito por Peris- 2005.
 Para Darbra 2005, alguns aspectos ambientais portuários são mais importantes do que outros. Para estes autores um ponto essencial para um sistema de manejo ambiental portuário é a identificação dos problemas ambientais significativos, os quais chamaram de Significant Environmental Aspects SEA’s Segundo Peris-Mora, nem as normas da ISO 14.001 e EMAS forneceriam um método a ser aplicado para identificar os SEA’s e avaliar a sua significância. Tendo em vista estes aspectos, desenvolveram uma nova metodologia, denominada de SOSEA Strategic Overciew of Significant Environmental Aspects, elaborada em colaboração com portos europeus, onde foi testada. 
Concluíram que as informações obtidas através desta metodologia podem ser úteis para o manejamento portuário em distintas formas.
 Primeiramente, dá uma evidência dos aspectos ambientais significativos relacionados às atividades portuárias, sendo que a etapa de identificação dos problemas/impactos é extremamente importante se a sua significância ainda não foi bem estabelecida. Wooldridge 1999 assinalaram que a sustentabilidade das atividades da área portuária só pode ser alcançada pelo efetivo manejo de protocolos que integrem imperativos sócio-econômicos, legais, técnicos e ambientais. Isto requer uma abordagem interdisciplinar, devendo-se ter ciência de que os objetivos ambientais, comerciais, regulamentações legais e as diretivas políticas ocorrem ao mesmo tempo, possuindo demandas conflitivas para com aqueles que tenham como responsabilidade o manejo ambiental. 
No Brasil, o MMA 1996 elaborou o “Macrodiagnóstico da Zona Costeira do Brasil”, sendo este um instrumento para orientar relações intersetoriais e interinstitucionais, mostrando, através de cartas-síntese, as  dinâmicas físico-naturais e sócio-econômicas, bem como as tendências gerais, sendo, a atividade portuária, um dos aspectos abordados.
 Em 1998, o Conselho Interministerial para os Recursos do Mar CIRM, 1998 estabeleceu a Agenda Ambiental Portuária, que teve como objetivo a adequação do setor portuário aos parâmetros ambientais estabelecidos na legislação, vigentes no país, visando o estabelecimento de mecanismos que possibilitassem o acompanhamento e o cumprimento das normas de preservação ambiental em todos os portos
Entre outros aspectos, a Agenda procurou: 
a) estabelecer procedimentos para confecção de planos de contingência para preparação e resposta em caso de acidentes; 
b) estabelecer procedimentos para monitoramento e controle ambiental da atividade portuária
c) estabelecer orientações gerais para a expansão do setor; 
e d) estabelecer mecanismos para correção da problemática ambiental nos portos brasileiros

Cada porto, segundo suas particularidades ambientais e organizacionais, deveria criar uma normatização dos procedimentos da operação portuária, de forma a evitar impactos ao meio ambiente. Esta normatização deve ser compatibilizada com a legislação vigente e as normas de segurança à navegação e com os demais instrumentos de atuação, como os estabelecidos pela Marinha Brasileira, acordos internacionais, etc., abordados por Porto & Teixeira 2002. 
Os programas devem ser estabelecidos no processo de licenciamento ambiental dos empreendimentos portuários e/ou estabelecidos pela Autoridade Portuária, de acordo com a realidade local SILVA & CYPRIANI. Propõe-se ainda na Agenda a criação da Agência Ambiental do Porto Organizado, órgão gerencial vinculado à administração do porto, responsável pela elaboração e implementação de um Sistema ou Programa de Gestão Ambiental. A agência deverá trabalhar sob orientação do Conselho de Autoridade Portuária  CAP organismo  responsável pelo cumprimento das normas de proteção ao meio ambiente na área de abrangência do Porto Organizado APO – Área de Porto Organizado, conforme preconizado pela Lei nº 8.630/93. Kitzmann & Asmus 2006 ressaltaram que a gestão ambiental é um conjunto de programas e práticas administrativas e operacionais voltados à proteção do ambiente e à saúde e segurança de trabalhadores, usuários e  comunidade
Apesar dessa abrangência e importância, e de ser um diferencial competitivo em vários setores da economia, a gestão ambiental ainda é pouco aplicada no sistema portuário brasileiro.
 Para os autores, a Lei 8.630/93 não contemplou de forma decisiva a questão ambiental na atividade portuária brasileira
Por não ser considerado um fator estratégico na grande complexidade das reformas portuárias pretendidas pela lei, a dimensão ambiental entrou no sistema via judicial, resultante principalmente de demandas do Ministério Público. Como conseqüência, mesmo passados tantos anos da promulgação da lei, poucas autoridades portuárias têm unidades ambientais adequadamente estruturadas, com pessoal qualificado e em número suficiente, orçamento próprio e políticas consistentes e continuadas.
 Se nos últimos anos houve melhorias na gestão ambiental nos portos brasileiros, muito se deve ao esforço individual de cada porto, em face do pouco realizado pelo poder público nessa área. 
Segundo Cunha 2006 os portos brasileiros são objetos tardios de políticas ambientais. Com a privatização parcial do setor portuário pela Lei 8.630, permanece dúbio na legislação ambiental e portuária o efetivo papel da Autoridade Portuária quanto à implantação de Programas ou Sistemas de Gestão Ambiental, de forma integrada com os operadores portuários. Existe na APO tanto áreas sob responsabilidade pública, como as atividades/áreas sob responsabilidade da iniciativa privada. 
Existem poucos trabalhos relacionados a esta temática no Brasil. 
Souza 2005 efetuou um levantamento de sistemas de gestão ambiental na atividade portuária na região portuária de Paranaguá e Antonina PR e Alberti 2005 realizou um estudo sobre desempenho sócio-ambiental de um terminal portuário, os Terminais Portuários da Ponta do Félix TPPF.
 Nos portos de Recife e Suape PE, Sá 2008 diagnosticou as características específicas de cada porto, identificando os procedimentos adotados em atendimento aos requisitos e exigências legais e as suas dificuldades. 
Um estudo de caso, sobre um conflito sócio-ambiental real, ocorrido no Porto de Santos, em 2004, causado pelo odor desagradável exalado por milhares de toneladas de pellets de polpa cítrica, foi efetuado por Mossini 2005. A solução dos problemas ambientais nas áreas portuárias é complexa, demandando um somatório de esforços de vários setores, na busca de alternativas inovadoras que superem as barreiras administrativas e culturais que têm retardado a implementação de práticas mais adequadas de gestão, inclusive ambientais KITZMANN & ASMUS. Para Cunha 2006, as atividades portuárias estão na origem de amplas transformações dos ambientes regionais, e carregam constantemente vasto potencial de impactos CUNHA, 2006. Em muitos casos, terminais de uso portuário privativo, adjacentes às áreas sob administração pública, possuem licenciamento ambiental independentemente da Autoridade Portuária, alguns no órgão ambiental federal e outros no órgão estadual, enquanto que a Autoridade Portuária em si não possui o licenciamento do complexo portuário. Tal fato gera sérias complicações na captação de recursos para a ampliação portuária, cujos financiamentos solicitam a regularização da Autoridade Portuária junto aos órgãos ambientais. Agra Filho 2005 desenvolveu um estudo visando contribuir para a superação da fragmentação e superposição de procedimentos relativos ao licenciamento ambiental. Outros itens necessários à gestão ambiental portuária, como o Plano de Gestão de Resíduos Sólidos PGRS, Plano de Emergência Individual PEI, Plano de Contingência PC, Plano de Ajuda Mútua PAM e Plano de Área PA, ficam comprometidos pela fragmentação dos licenciamentos ambientais entre os diversos operadores, ou mesmo pela inexistência destes. 
Cunha 2003; 2006 e Cunha 2007 assinalaram que as dificuldades de regularização das atividades portuárias em relação aos parâmetros ambientais são conseqüência não apenas da ausência histórica das preocupações ambientais por parte de gestores e operadores destas atividades. Devem ser igualmente reconhecidas e postas em pauta as limitações da política ambiental pública em seu atual estágio de evolução no país, limitações estas tanto mais relevantes quanto se trata de administrar situações e atividades pré-existentes, que não passaram por licenciamentos ambientais prévios. Estas dificuldades se ampliam quando é o caso, típico dos portos, de administrar transformações múltiplas e complexas em ambientes regionais naturais e construídos, diversificados, o que esbarra geralmente na ausência de políticas ambientais integradas e abrangentes em escalas regionais.
Fonte

Os portos de Paranaguá (PR) e Itajaí (SC): análise comparativa das suas relações com as cidades de inserção, da estrutura operacional atual e das condições sócio-ambientais das regiões de entorno / Carlos Roberto Soares. – Curitiba, 2009.

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