Empresas portuárias com contratos vencidos ou prestes a
vencer, os chamados "pré-1993", já se articulam para tentar uma
solução no provável governo de Michel Temer PMDB, que teve ascendência nos
portos em particular no de Santos SP, na segunda metade da década de 1990.
Representados pela ABTP, ao
menos 20 terminais em vários portos do país voltarão à carga para tentar ganhar
mais prazo para continuar explorando as áreas da União nos portos que ocupam
sem terem passado por licitação. Algumas empresas não vinculadas à ABTP também
o farão.
A regra da licitação como crivo para explorar área em
porto público só foi estabelecida em 1993, com a primeira lei do setor. Os
contratos antigos, que eram geralmente válidos por dez anos, deveriam ser
adaptados a ela em até 180 dias. As empresas sustentam que o termo
"adaptação" significava, entre outros, estender o contrato pelo prazo
determinado pela nova lei de 1993 - até 25 anos , mas que isso não foi feito.
"Pedimos reunião com o vice-presidente Michel Temer
e com Eliseu Padilha para falar disso e de outros assuntos do setor",
disse o presidente da ABTP, Wilen Manteli, referindo-se ao presidente.
A tese é
fazer investimentos nas áreas e ganhar o tempo necessário para amortizá-los,
desde que não exceda 25 anos o prazo máximo da Lei dos Portos.
Segundo fontes ouvidas pelo Valor, o PMDB seria mais
permeável à concessão de um prazo adicional às empresas. Na conversão da MP dos
Portos em lei, em 2013, houve várias emendas que davam mais tempo para esses
contratos. Sobreviveu uma, mas Dilma Rousseff a vetou.
As empresas, contudo,
nunca se deram por vencidas.
Tentaram aprovar uma saída nas gestões dos
ex-ministros dos Portos Edinho Araújo e Helder Barbalho, ambos do PMDB. O
pleito chegou no segundo semestre do ano passado à Casa Civil, mas não avançou.
Se adotada, a medida desidratará o programa de
arrendamentos portuários, pois nas 93 áreas previstas para irem a leilão há ao
menos 20 terrenos de contratos pré1993. Algumas áreas foram aglutinadas nos
editais para formar terminais maiores, com ganho de escala, como é ao redor do
mundo.
Eliseu Padilha era ministro dos Transportes de 1997 a
2001, quando foram feitas as primeiras licitações portuárias e se cunhou o
termo "favelização" para designar alguns trechos de alguns portos. O
termo, popularizado nos anos 90, se refere ao fatiamento de áreas concedidas
sem planejamento, que gerou pequenos terminais.
Foi a época que o PMDB mais teve ascendência em Santos.
O
então deputado federal Michel Temer avalizou nomes para a presidência da Codesp,
a estatal que administra o porto de Santos.
A Codesp estava então sob investigação do Ministério
Público e Tribunal de Contas da União TCU. Em acórdão do TCU de 2002, sobre
auditoria nos contratos de arrendamentos e serviços firmados pela estatal
portuária, o TCU lista áreas concedidas sem licitação, mudança de objeto de
contrato, troca de áreas e perdão de dívidas por parte da estatal - como no
caso do navio cimenteiro "Heraclis Spirit", que zarpou sem que a
empresa pagasse R$ 7 milhões em 1998.Gerando um enorme calote.
Em outro caso, a estatal deixou de fazer licitação para
exploração de dois armazéns e de um terminal. O TCU determinou que a Codesp
realizasse a concorrência, mas isso nunca aconteceu. Em 2009 a corte reviu a
posição e convalidou o contrato.
A Codesp sempre foi, em maior ou menor medida, feudo
político-partidário. Depois do PMDB transitou para as mãos do PR, no primeiro
governo Lula. Com a criação da Secretaria de Portos SEP, em 2007, os portos saíram
do Ministério dos Transportes. A SEP foi assumida pelo PSB e, no segundo
governo Dilma, voltou para o PMDB.
Quando Wagner Rossi, também ligado a Temer, assumiu a
Codesp em 2000, esses casos já tinham estourado. Rossi disse na ocasião que
faria um pente fino em 50 contratos de arrendamentos e serviços para apurar
eventuais irregularidades. No que me competia dei seguimento aos procedimentos
relativos às questões arroladas, muitas das quais foram objeto de processos
judiciais. Não só não arquivei qualquer procedimento administrativo a eles
referente como estimulei os órgãos competentes na administração da Codesp a dar
continuidade rigorosa às apurações. Segundo ele, Temer nunca lhe pediu nada nem
qualquer outra autoridade tentou interferir em sua administração.
Na gestão de Rossi, a Codesp pagou R$ 126 milhões à
Previdência de dívida de empresas contratadas pelo porto de Santos. O caso foi
objeto de julgamento judicial transitado em julgado, em desfavor dos que
questionaram o acordo entre a estatal portuária e a Previdência.
Mas foi em 1998, que a Codesp, então sob presidência de
Paulo Fernandes do Carmo, fechou o negócio que mais tarde seria a causa do
maior passivo da estatal - o "caso Libra ", que se tornou a mais
ruidosa novela do setor portuário.
A Libra é uma empresa da família Borges Torrealba, do Rio
de Janeiro, que tem atuação no porto de Santos desde 1995, quando arrematou sua
primeira área no cais, o Terminal 37.
O problema começa três anos depois, quando o grupo venceu
a licitação para explorar o Terminal 35 ao oferecer à Codesp a melhor proposta:
um valor dez vezes maior que o fixado no edital pelo aluguel da área; royalty
por contêiner movimentado cinco vezes superior; e movimentação mínima quatro
vezes acima do previsto. Ainda em 1998 a Libra começou a contestar as faturas
alegando que recebera a área em desconformidade com o edital.
Deixou de pagá-las na íntegra e se tornou a maior
devedora do porto, apesar de nunca reconhecê-lo ao argumentar que não recebeu o
prometido. Passou a pagar o que considerava justo em juízo.
"A Libra
Terminais jamais esteve inadimplente. Durante todo o período de arrendamento,
pagou os valores do T-35 em juízo, mensalmente e de forma regular, sempre
cumprindo as decisões judiciais", disse a empresa em nota. Em 2014 o
débito da Libra respondia por 94% do R$ 1,14 bilhão de contas a receber da
Codesp, conforme balanço da estatal na ocasião.
Sem acordo entre as partes, a salvação para a Libra veio
das mãos do deputado Eduardo Cunha PMDB, em 2013. O parlamentar conseguiu
aprovar emenda na Lei dos Portos que, na prática, permitia a renovação de
contratos de empresas inadimplentes desde que o débito fosse discutido em
arbitragem, uma novidade.
No dia 9/6/2015 o governo baixou o decreto
regulamentando a arbitragem portuária logo depois de anunciar a segunda fase do
Programa de Investimentos em Logística PIL, no Palácio do Planalto. De imediato
o instrumento foi batizado de "decreto Libra".
Três meses depois, a Libra assinou a arbitragem para
debater o valor do débito que tem com a Codesp há 17 anos. E renovou o contrato
do Terminal 35 no porto de Santos por mais 20 anos, unificando os três
contratos que explora no cais ,os Terminais 35 , 37 e 33. Com isso, se
comprometeu a investir R$ 750 milhões em um único terminal de contêineres.
"A manutenção do contrato de concessão dos três
terminais hoje operados pela Libra em Santos depende do cumprimento
incondicional da decisão da corte arbitral. No prazo inicial de 24 meses, os
árbitros apontarão se há débitos a serem pagos e por qual das partes
envolvidas. A decisão é irrecorrível. E um eventual não cumprimento levará à
extinção do contrato de operação dos três terminais santistas. Não há,
portanto, nenhum benefício ou prejuízo para Libra Terminais ou Codesp",
disse o grupo.
O deputado federal Edinho Araújo PMDB, ministro dos
Portos na época da renovação do contrato da Libra, disse que o processo seguiu
toda a legislação e teve o acompanhamento da Advocacia Geral da União AGU,
Ministério do Planejamento, da própria Presidência da República, da Antaq e da
área técnica da SEP. "O acordo é vantajoso para o poder público a Codesp e
a empresa, uma vez que, devido à pendência judicial, a Libra vinha recolhendo
apenas um valor estimativo mensalmente à Codesp", disse Araújo.
Fonte: Valor Econômico/Fernanda Pires | De São Paulo
https://www.portosenavios.com.br/noticias/portos-e-logistica/34283-grupos-portuarios-vao-tentar-alongar-contratos-vencidos
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