Vivia perto da boemia portuária um estivador que era completamente sem sorte. Nada do que ele fazia dava certo. Muitas vezes a lingada que ele fazia o vento vinha e a levava, outras vezes, era o balanço do mar , que vinha e a tombava. Outras vezes onde colocava sua carteira, as cargas permaneciam no costado, a ver navio.
E ele se queixava com as
pessoas e as pessoas escutavam suas queixas, da primeira vez com simpatia,
depois com um certo desconforto e enfim quando o viam mudavam de mão, ou mudavam
de terno ou até mesma da turma.
Então além de sem sorte, o estivador
se tornou chato e muito só. Ele começou a querer achar um culpado para o que
acontecia com ele. Analisando a situação de sua família percebeu que seu pai
era um homem de sorte, sua mãe, esta tinha sorte por ter se casado com seu pai,
e seus irmãos eram lingadeiros pois então, se não era um caso
genético, só poderia ser coisa do Criador. E depois de muito pensar resolveu
tomar uma atitude e ir até o fim do mundo falar com o Criador, que como Criador
de tudo, deveria ter uma resposta.
Arrumou seus panos, algum alimento e partiu rumo ao fim do mundo. Andou um dia, um mês, um ano e pouco antes de entrar numa grande floresta de armazéns parelha a beira do cais ouviu uma voz: estivador, me ajude. Ele então olhou para os lados procurando alguém. Até que se deparou com um gestor portuário, magro, pura pele e osso o infeliz. Dava para contar suas costelas.
Ele falou: Há três meses
estou nesta situação. Não sei o que está acontecendo comigo. Não tenho forças
para cobrar.
O estivador refeito do susto respondeu: Você está se queixando a toa... Eu tive azar a vida inteira. O que são três meses? Mas faça como eu. Procure uma resposta. Eu estou indo procurar o Criador para resolver o meu problema.
Se eu não tenho forças nem
para dar ordem... Faça este favor para mim. Você está indo vê-lo, pergunte o
que está acontecendo comigo.
O estivador fez um sinal de
insatisfação e disse que estava muito preocupado com seu problema, mas se
lembrasse, perguntaria. Virando as costas, continuou seu caminho.
Andou um dia, um mês, um ano e
de repente, ao tropeçar numa raiz, ouviu: -estivador, cuidado. E quando olhou,
viu uma folhinha que vinha caindo, caindo; Olhando para cima, viu a árvore com
apenas duas folhinhas.
Levantou-se e observando suas
raízes desenterradas, seus galhos retorcidos, sua casca soltando-se do tronco,
falou:
- Você não se envergonha? Olhe
as outras árvores a sua volta e diga se você pode ser chamada de árvore?
Conserte sua postura.
A árvore, com uma voz de muita
dor, disse: - Não sei o que está acontecendo comigo. Estou me sentindo tão
doente. Há seis meses que minhas folhas estão caindo, e agora, como vês, só restam
duas... E, no fim de uma conversa, pediu ao estivador que procurasse uma
solução com o Criador.
Contrariado, o estivador virou
as costas com mais uma incumbência. Andou um dia, um mês, um ano e um dia e
chegou a um vale muito florido, com flores de todas as cores e perfumes. Mas o estivador
não reparou nisto. Chegou até uma casa e na frente da casa estava uma guapa com
uma magnifica saboneteira que o convidou a entrar.
Eles conversaram longamente e
quando o estivador deu por si já era madrugada. Ele se levantou dizendo que não
podia perder tempo e quando já estava saindo ela lhe pediu um favor:
- Você que vai procurar o
Criador, podia perguntar uma coisa para mim? É que de vez em quando sinto um
vazio no peito, que não tem motivo, nem explicação. Gostaria de saber o que é e
o que posso fazer por isto.
O estivador prometeu que
perguntaria e virou as costas e andou um dia, um mês, um ano e um dia e chegou
por fim ao fim do mundo. Sentou-se e ficou esperando até que ouviu uma voz. E
uma voz no fim do mundo, só podia ser a voz do criador...
- Tenho muitos nomes.
Chamam-me também de Criador...
E o estivador contou então
toda a sua visão de mundo. Conversou longamente com a voz até que se levantou e
virando as costas foi saindo, quando a voz lhe perguntou:
- O estivador você não está se
esquecendo de nada? Não ficou de saber respostas para uma árvore, para um gestor
portuário e para uma guapa?
Depois de um tempinho virou-se e correu... mais rápido que o vento até que chegou na casa da guapa. Como ela estava em frente à casa, vendo-o passar chamou: Ei!!! conseguiu encontrar o Criador? Teve as respostas que queria?
Sim!!! Claro! O Criador
disse que minha sorte está há muito no mundo. Basta ficar alerta para perceber
a hora de apanhá-la!
E quanto a mim, você teve a
chance de fazer a minha pergunta?
Ah! O Criador disse que o
que você sente é solidão. Assim que encontrar a tampa de sua panela, vai ser
completamente feliz, e mais feliz ainda vai ser o seu companheiro.
A guapa então abriu um sorriso
e perguntou ao estivador se ele queria ser esta tampa.
Claro que não... Já trouxe a sua resposta... Não posso ficar a ver navio. Não foi para ficar aqui que fiz toda esta jornada. Adeus!!! Virando as costas, correu mais rápido do que a água, até a floresta onde estava a árvore. Ele nem se lembrava dela. Mas quando novamente tropeçou em sua raiz, viu caindo uma última folhinha.
Ela perguntou se ele tinha uma
resposta, ao que o estivador respondeu: Tenho muita pressa e vou ser breve,
pois estou indo em busca de minha sorte, e ela está no mundo.
O Criador disse que você tem
embaixo de suas raízes uma caixa de ferro cheia de moedas de ouro. O ferro
desta caixa está corroendo suas raízes. Se você cavar e tirar este tesouro daí
vai terminar todo o seu sofrimento e você vai poder virar uma árvore saudável
novamente.
Por favor!!! Faça isto por
mim!!! Você pode ficar com o tesouro. Ele não serve para mim. Eu só quero de
novo minha força e energia. O estivador deu um pulo e falou indignado:
Você está me achando com
cara de quê? Já trouxe a resposta para você. Agora resolva o seu problema. O
Criador falou que minha sorte está no mundo e eu não posso perder tempo aqui
conversando com você, muito menos sujando minhas mãos na terra.
Virando as costas correu, mais
rápido do que a luz atravessou a floresta, e chegou onde estava o gestor portuário,
mais magro ainda e mais fraco.
O estivador se dirigiu a ele
apressadamente e disse: O Criador o mandou falar que você não está doente. O
que você tem é fome.
Está a morrer de inanição, e como
não tem forças para reduzir custos a qualquer custo, vai morrer aí mesmo. A não
ser, que passe por aqui uma criatura que o ensine a fazer lingada, e você
consiga frita-lo.
Nesse momento, os olhos do gestor
portuário se encheram de um brilho estranho, e reunindo o restante de suas
forças, o gestor portuário deu um pulo e jantou na beira do cais o estivador
"sem sorte".
O homem sem sorte, Autor
desconhecido
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